O Exorcista (The Exorcist – 1973)
Em Georgetown, Washington, uma atriz vai gradativamente tomando consciência que a sua filha de 12 anos está tendo um comportamento completamente assustador. Deste modo, ela pede ajuda a um padre, que também é um psiquiatra, e este conclui que a garota está possuída pelo demônio.
Lembro que li o livro de William Peter Blatty antes de ver o filme, por volta dos meus 9 anos de idade. Numa das minhas primeiras visitas a uma Bienal do Livro (tipo de excursão promovida pela escola em que se contava nos dedos de uma mão o número de alunos interessados em ir, mas era a mais aguardada por mim), encontrei-o e me recordo que sua capa me chamou muito a atenção. Nela haviam vários olhos enigmáticos, como num caleidoscópio.
Como desde muito novo sempre adorei a literatura de horror, devorei-o em menos de uma semana. De lá para cá, já reli a obra três vezes, mas sempre me lembrarei de como ela tirou meu sono da primeira vez.
Como estudava em colégio de freiras, passear pelos corredores carregando o “livro ruim” (como as ingênuas freiras chamavam-no, na tentativa de me impedir a leitura) chamava bastante atenção. Dentre todos os livros de horror que já li, “O Exorcista” foi, sem dúvida, o mais apavorante. Não somente pelo tema, mas a construção de clima e suspense eram inigualáveis. O escritor conseguiu fazer até os ateus sentirem medo do diabo.
Ver aquelas páginas transpostas para a tela da televisão em uma sessão da madrugada televisiva foi uma experiência inesquecível. A operação que tive de realizar para vê-lo foi digna de um espião britânico, enfrentando a provação de aguentar sozinho até o final no breu total do quarto.
Na época, eu estava acostumado com obras de terror que tinham uma aura divertida, como “A Hora do Espanto” e “A Volta dos Mortos Vivos”, mas nada me preparou para aquela experiência séria e adulta, promovida pelo diretor William Friedkin. Aos 10 anos, senti como se tivesse entrado escondido em um lugar proibido, vendo coisas que eu não deveria ver. E, claro, adorei cada minuto da experiência.
O grande trunfo deste filme, comparando-o com obras similares modernas, era o comprometimento do diretor com a seriedade (a mesma verossimilitude que inspirou Richard Donner a nos fazer acreditar em “Superman”). A equipe lidou com a história como se estivessem filmando um documentário, transbordando realidade em cada cena.
O próprio escritor sugeriu a presença de Friedkin na direção, pois conhecia sua postura direta e realista ao transmitir suas ideias. Assim foi com sua obra policial: “Operação França” (The French Connection – 1971), que de tão real, se permitiu um final nada comum, porém, completamente sintonizado com sua época.
A imagem que fica gravada na retina para sempre é a da jovem Reagan (Linda Blair), mas “O Exorcista” é muito mais do que apenas uma criança possuída vomitando e girando a cabeça. Existe toda uma gama de personagens bem construídos, como o relutante padre Damien Karras (Jason Miller), que descobre estar perdendo sua fé, enquanto vê o lento e penoso calvário de sua mãe, enxergando na jovem vítima sua última chance de redenção. O detetive Kinderman (Lee J. Cobb), um cinéfilo inveterado, que parece só se interessar em trabalhar no caso porque a mãe da jovem é uma atriz de relativo sucesso.
A mãe é vivida por Ellen Burstyn, num de seus melhores momentos. Como se esquecer do problemático diretor Burke Dennings (Jack MacGowran) e do imponente Lancaster Merrin (Max von Sydow)? O padre que dedicou sua vida inteira a procurar seu imortal oponente nos lugares mais inóspitos do mundo, mas que descobre surpreso que irá travar sua batalha final no confinamento de um pequeno quarto.
Há outros projetos muito interessantes realizados na mesma época, mas ainda considero “O Exorcista” o melhor filme de terror de todos os tempos. A lembrança de Linda Blair presa numa cama proferindo maldições naquela voz gutural ainda me causa um arrepio na espinha.
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