O Médico e o Monstro (Dr. Jekyll and Mr. Hyde – 1931)
Na sua novela “O Médico e o Monstro” (Strange Case of Dr. Jekyll and Mr. Hyde – 1886), Robert Louis Stevenson trabalha com um tema que sempre exerceu grande fascínio nele: a influência da personalidade nas atitudes de uma pessoa. O Dr. Jekyll se refere ao Sr. Hyde (“hide” = escondido) como um amigo e benfeitor, algo que se confirma em seu ato de evitar adentrar a casa pela porta principal (“ele sempre entra e sai pelo laboratório”) enquanto se esconde em sua segunda personalidade, revelando profundo respeito pela sua identidade.
Como se Jekyll, que se frustrava com a constatação de sua própria finitude (aos cinquenta anos e já tendo escrito seu testamento), necessitasse de Hyde para extravasar todas as rebeldias interiores, de furtivos encontros com mulheres da vida a simples confrontos de ideias, sempre contidas devido ao seu status na sociedade. É possível cogitar a hipótese de que Hyde na realidade é a verdadeira natureza de Jekyll, um homem triste envolvido por um hipócrita disfarce. Diferente do que muitos simplificam como um conto de bem contra o mal, acredito que a intenção de Stevenson era criar uma alegoria fascinante sobre a batalha interna da moralidade imposta pela sociedade contra os instintos naturais do ser humano.
Hyde é retratado no livro de forma bastante lúdica: “… Não é fácil descrevê-lo. Existe algo de errado em sua aparência, algo desconfortável, detestável… Ele deve ter alguma deformação, pois passa uma forte sensação de deformidade, mesmo que não consiga especificar qual…”. Obviamente uma forma mais simples de retratá-lo imageticamente no cinema seria transformá-lo em um monstro.
No filme “O Médico e o Monstro” (Dr. Jekyll and Mr. Hyde – 1931), o competente diretor Rouben Mamoulian acerta ao utilizar sutilmente o conflito da trama como o violento revide contra uma repressão. Utilizando tomadas com extensão do ponto de vista (câmera subjetiva), ele nos apresenta o mundo pelos olhos de seu protagonista, incitando a identificação imediata neste contexto, algo que intensifica ainda mais o horror causado na cena de transformação.
O Dr. Jekyll (vivido por Fredric March, que recebeu o Oscar de Melhor Ator) é apresentado como um egocêntrico e um inconsequente, enquanto seu “id” Hyde possui a aparência de um símio (referenciando Darwin) e representa o lado mais primitivo do homem, liberto de qualquer medo. O seu corpo não para de se mover, como um leão solto na floresta após anos preso em uma jaula.
Tudo trabalhado com elegância e coragem, sem apelar para os elementos que infantilizavam muitas das produções similares da Universal do mesmo período.
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