Nosferatu (Nosferatu, eine Symphonie des Grauens – 1922)
A distribuidora “Classicline” está lançando no mercado um tesouro de valor inestimável para os cinéfilos mais dedicados. A obra definitiva de horror, que até o presente momento havia sido lançada no home vídeo brasileiro de forma bastante desleixada, com imagens escurecidas em preto e branco (sem a tintura original) e com vários cortes, está recebendo o merecido tratamento de luxo.
O DVD utiliza a matriz da versão restaurada pela Kino, que resgatou a obra completa em seus 93 minutos, com expansão de cenas, criação de uma nova trilha sonora, inserção de intertítulos que haviam sido perdidos e retrabalhando as matizes das tinturas que diferenciavam ambientes e ajudavam na imersão dos espectadores. O resultado é o mais próximo possível da experiência que o público teve na época de sua estreia. E tenho inveja destes senhores…
O nome do protagonista nasceu do eslavo Nosufuratu, que por sua vez foi adaptada do grego nosophoros, que significa “transportador de pragas”. E é exatamente o que o Conde Orlok (Max Schreck) representa na obra. Ele carrega a praga para Bremen em sua viagem marítima, numa alusão a uma praga de ratos real que ocorreu na cidade por volta de 1840, exatamente o período retratado no filme. A aparência do vampiro também reflete esse tema, diferindo totalmente do “Drácula” aristocrata de Stoker, assemelhando-se claramente a um rato.
Um fator que considero fundamental para entender a importância desse filme é ele ter sido responsável por uma das regras essenciais no eterno mito do vampiro (pelo menos, até “Crepúsculo” aparecer e destruir o conceito): a aversão à fatal luz do dia. O diretor F.W. Murnau sabia que corria risco de ser processado pelo escritor Bram Stoker, já que iria realizar uma cópia de “Drácula”, então sabiamente decidiu modificar o desfecho da trama. Em vez do embate com Van Helsing e sua estaca, o vampiro seria destruído pelo contato com os raios solares.
Incrível imaginar que este e outros elementos do filme que seriam amalgamados ao mito, não nasceram de qualquer impulso criativo consciente, mas apenas do medo de não serem flagrados cometendo o crime de plágio. E fracassaram no intento, o que é ainda mais fascinante.
O ato não impediu o eventual processo, que foi vencido pela viúva de Stoker, resultando num acordo que implicava em uma queima de arquivo, com todas as cópias e negativos tendo sido destruídos. Este foi o único filme lançado pelo estúdio Prana Film, de Albin Grau e Enrico Diekmann, que abriram falência após os problemas legais. O mundo seria impedido de assistir esta obra-prima do Expressionismo Alemão. Claro que, como todo vampiro, Nosferatu aguardava apoiado em sua janela, espreitando a sociedade e aguardando a hora certa para voltar.
Uma única cópia foi salva do fogo e enviada para os Estados Unidos, tornando-se a matriz de todos os lançamentos feitos desde então. Conquistando públicos cada vez mais fiéis em suas exibições, por volta da década de 60, ele já havia sido alçado ao posto de Cult e clássico admirado. Sem os esforços de Murnau e o sucesso do filme em seu lançamento, com toda certeza a Universal não teria considerado lucrativo realizar sua versão com Bela Lugosi, quase dez anos depois. Sem falar que a postura corporal e o caminhar lento e ameaçador imortalizado por Max Schreck, serviu de influência para o “Frankenstein” de Boris Karloff.
E se pensarmos que “O Vampiro da Noite”, realizado pelos estúdios Hammer em 1958, só foi lançado como consequência do sucesso popular do vampiro nas décadas anteriores, conclui-se sem exagero que “Nosferatu” é o principal responsável pela existência do mito na cultura popular até os dias de hoje.
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