Artigo

A arte de José Mojica Marins, o nosso “Zé do Caixão”

(TEXTO ESCRITO E PUBLICADO EM 2014)

Abordar a obra do diretor José Mojica Marins e sua importância para o cinema nacional é tarefa difícil, pois graças a ele mesmo e seu senso de humor, nós nos acostumamos a ver sua persona como algo cômico.

Antes de começar, peço que tire do rosto o sorriso debochado. José Mojica ri de si mesmo e sabe de suas fragilidades artísticas e pessoais, mas ele não as usa como um empecilho para sua criatividade. As suas ideias podem soar antiquadas, mas são suas próprias, não as copiou. Um diretor que bate no peito e diz: “Sou capaz”. Quisera o nosso cinema tivesse mais uns dez assim.

Para se analisar sua obra é preciso esclarecer algumas informações essenciais. O cinema de terror possui várias facetas, uma delas é o chamado “gore” (horror explícito, nojento). Mojica iniciou esse tipo de cinema em 1964 com “À Meia-Noite Levarei a Sua Alma”. Somente em 1968, um diretor americano estreante chamado George Romero fez fama internacional utilizando o mesmo conceito em seu, hoje marco inquestionável do gênero, “A Noite dos Mortos-Vivos”. O diretor estrangeiro é respeitado e cultuado mundialmente, enquanto nosso Mojica é alvo de críticas e menosprezo em seu próprio País. Parte deste preconceito tem origem no próprio humor do diretor, que se permitiu ao longo de sua carreira utilizar o personagem “Zé do Caixão” em várias aparições públicas.

Como se Sylvester Stallone aparecesse em vários programas de TV utilizando a faixa vermelha de “Rambo” na cabeça. O personagem tornou-se uma figura pública e passeou por várias mídias (quadrinhos, rádio, propagandas e atualmente um programa de entrevistas), um processo que, com o tempo, ajudou a banalizar o impacto que ele causava no seu público. Uma de suas obras menos conhecidas: “O Despertar da Besta/Ritual dos Sádicos” (de 1969), ficou proibida pelos militares de ser exibida por vinte anos, mas é uma pequena obra-prima do terror.

José Mojica fez algo raríssimo no cinema nacional: ele criou um personagem complexo e fez fama internacional com ele, utilizando as nossas tradições e medos. Como autor e diretor, ele ousou pôr a cara à tapa, sem medo das críticas. Possivelmente, o preconceito irá continuar por aqui, onde ele continuará sendo tido pelo nosso povo, pelo seu próprio povo, como um velho louco.

A história de sua fama internacional como “Coffin Joe” obterá mais capítulos e seu nome será seguido de palmas nos festivais de cinema fantástico pelo mundo afora. Nós continuaremos os mesmos e, para nossa sorte, ele também.

Octavio Caruso

Viva você também este sonho...

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