Críticas

“Yojimbo”, de Akira Kurosawa

Yojimbo (Yôjinbô – 1961)

Toshiro Mifune é Sanjuro, um ronin que chega numa cidadezinha a procura de emprego. O lugar é palco de uma guerra entre dois mercadores rivais, o samurai então se oferece aos dois para prestar serviços nada leais.

Akira Kurosawa buscou inspiração nos faroestes americanos e no livro “Seara Vermelha”, que Dashiell Hammett escreveu em 1929, carregando as artimanhas do detetive para o cenário do Japão na iminência da Restauração Meiji, transformando-o em um ronin com sérios problemas com piolhos, elemento que Toshiro Mifune trouxe para o personagem, fazendo seu constante balançar de ombros uma marca registrada. É interessante perceber o conflito modernidade/tradição, característica essencial em muitos faroestes, sendo representado pelo personagem Unosuke (vivido por Tatsuya Nakadai), sempre acompanhado de seu revólver.

A obra, além de ter servido de inspiração para Sergio Leone em “Por Um Punhado de Dólares”, foi também bastante representativa dentro de seu próprio gênero, estabelecendo com seu anti-herói atormentado, cínico e irreverente uma fórmula vencedora para os chambara subsequentes. Ao revê-la, constatei que talvez seja a mais acessível do diretor, mérito dos eficientes alívios cômicos e da narrativa objetiva, ágil e empolgante.

Outro aspecto que considero válido salientar é a excepcional trilha sonora subversiva de Masaru Sato, um mestre que acompanhou Kurosawa desde “Trono Manchado de Sangue” e também trabalhou com o diretor Kihachi Okamoto (em “A Espada da Maldição”). Esse pouco reconhecido talento teve como mentor o grande Fumio Hayasaka, compositor de “Rashomon” e “Os Sete Samurais”. Com ousadia, Sato misturou influências europeias e jazzísticas americanas às tradições asiáticas, ajudando a moldar sonoramente o gênero, além de ter sido clara inspiração para o celebrado trabalho de Ennio Morricone nos Westerns Spaghetti.

Sanjuro decide seu destino jogando um graveto para o alto, seguindo a direção que o vento escolheu apontar. Aquela cidade esquecida pelo tempo, onde é recebido por um cão carregando uma mão humana na boca, parece sobrenatural, uma sensação que é reforçada pela trilha sonora. O único indivíduo que prospera naquele ambiente é o responsável pela construção dos caixões. Como moldura, a fotografia do sempre competente Kazuo Miyagawa, repetindo a parceria estabelecida em “Rashomon”.

O protagonista age então como um anjo da morte no inferno, decidido a limpar aquele local de toda a corrupção.

Octavio Caruso

Viva você também este sonho...

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