Críticas

“O Homem Errado”, de Alfred Hitchcock

O Homem Errado (The Wrong Man – 1956)

Em Nova York, em janeiro de 1943, um músico (Henry Fonda) de uma casa noturna tem a vida remexida quando a mulher (Vera Miles) precisa de 300 dólares para tratamento dentário e ele, preocupado, vai a um escritório para saber quanto pode conseguir de empréstimo com a apólice dela. Porém, ele é identificado equivocadamente pelas funcionárias como sendo o criminoso que tinha invadido o local um ano antes.

A razão principal desta obra-prima ser usualmente esquecida em listas de melhores do diretor é exatamente o elemento que a torna grandiosa, sua total crueza estilística, sua abordagem quase documental, fugindo totalmente da fórmula exercitada pelo mestre do suspense em seus filmes mais famosos.

Aquele que o vê na expectativa de ser entretido pelas acrobacias narrativas do mestre, com certeza irá equivocadamente considerá-lo menor. O foco do tema estruturalmente reside no fator inesperado, não no suspense que antecede a probabilidade de eventos.

E, dentre todos os projetos em que Hitchcock trabalhou o conceito do inocente condenado injustamente, acredito que esse tenha sido o mais complexo, um interessante e sóbrio estudo sobre os danos psicológicos causados no indivíduo, além dos efeitos da destruição moral que acomete todos em sua volta.

Não era a primeira vez que o diretor abordava um evento real, mérito do impecável “Festim Diabólico” (Rope – 1948), que era inspirado no caso Leopold-Loeb, os dois estudantes criminosos.

A inteligência do diretor e sua capacidade fantástica de síntese imagética, direcionando o olho do espectador objetivamente para somente aquilo que precisa ser mostrado, normalmente é celebrada na introdução do protagonista de “Janela Indiscreta”, mas gosto também bastante da forma como ele nos apresenta o personagem de Henry Fonda.

Basta um breve sorriso de Manny Balestrero enquanto admira uma propaganda em um jornal, em que vemos um automóvel com uma mulher e duas crianças, para entendermos, por sua identificação emocional, que ele possui mulher e dois filhos. Em um momento posterior, podemos mensurar todos os conflitos internos que ele está vivenciando, simplesmente por mostrá-lo indefeso e fragilizado fisicamente enquanto os policiais registram suas impressões digitais.

A tragédia Kafkiana do herói comum, visualizada na maior parte das cenas por uma ótica quase bressoniana, um filme que somente melhora a cada revisão.

Octavio Caruso

Viva você também este sonho...

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