Críticas

“Pelos Olhos de Maisie”, de Scott McGehee e David Siegel

Pelos Olhos de Maisie (What Maisie Knew – 2012)

Vivemos em uma sociedade imediatista na qual o ato de ter filhos de forma impensada é irresponsavelmente incentivado pelo governo (quanto mais filhos, mais auxílio) e pelos vizinhos. Buscando satisfazer de forma prazerosa um capricho emocional, muitos se esquecem da tremenda responsabilidade que acompanha o nascimento de uma criança.

A inserção de um novo elemento transformador, cujas ações e omissões futuras irão afetar, para o bem ou para o mal, a vida de outros. E é disso que trata o romance de Henry James, escrito em 1897, mas que se mostra incrivelmente atual. Uma doce menina que sofre a influência negativa de adultos recentemente divorciados e que não demonstram competência sequer para guiar suas próprias vidas. A mãe, vivida por Julianne Moore, uma egoísta estrela do rock em declínio. O pai, vivido por Steve Coogan, um marchand que vê a filha como uma pedra em seu caminho profissional. Utilizam a menina como arma em uma guerra diária, ignorando que gradativamente estão destruindo a psique da criança.

Nos olhos de Onata Aprile (que vive Maisie), no constante uso de close-ups, percebemos desde a primeira cena uma resiliente força de caráter, como se ela já soubesse desde cedo que sua sobrevivência dependeria apenas de seus próprios esforços. Longe dos pais, ela se mostra alegre e livre, mas é possível perceber em alguns planos-detalhe, símbolos clássicos de solidão que se mostram à espreita. Ela sabe que a diversão dura pouco tempo, que a ilusão se desfaz no momento em que retorna para sua casa.

O roteiro de Carrol Cartwright e Nancy Doyne incita a revolta ao exibir claramente a criminosa manipulação dos pais, que se mostram capazes de iniciar novos relacionamentos, inserindo mais vítimas às suas estatísticas de destruição, apenas como estratégia de ataque. No lugar da gentil Sra. Wix literária, a adaptação nos entrega Margo (Joanna Vanderham), que ao lado de Lincoln (Alexander Skarsgard), ambos inseridos como peças em um calculista tabuleiro alheio aos seus sentimentos, dão vida à ideologia mais bonita do filme. Maisie percebe no carinho sincero desses dois personagens, que realmente se importam com ela, o real significado da parentalidade.

A direção de Scott McGehee e David Siegel evita o melodrama e capta nas entrelinhas o amor que a filha sente pelos pais, ainda que estes não a mereçam. A opção de visualizar tudo pela ótica da criança foi muito acertada, já que compartilhamos a confusão mental dela, indiferente aos motivos que os levaram a tanta hostilidade. Chegamos a compartilhar a sensação de desconforto ao escutarmos o som da voz da mãe se aproximando.

O problema não está na incompatibilidade dos pais, mas na inclusão da inocência nesse cenário corrupto. Inicialmente escutamos involuntariamente as brigas ao lado da menina, escondidos e apoiados no corrimão de uma escada, mas em pouco tempo os xingamentos passam a ser proferidos objetivando a percepção dela, com a intenção clara de posicioná-la ativamente em um campo de batalha.

Maisie procura o silêncio como forma de preservar sua sanidade e proteger seus pais. A sua preocupação evidencia a maturidade precoce. A crueldade inerente à essa tortura diária transforma os pais em monstros. E é a constatação dessa odiosa face no espelho que poderia trazer uma possibilidade de redenção, mas a realidade é dura, assim como o filme.

Octavio Caruso

Viva você também este sonho...

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