Capitão América 2 – O Soldado Invernal (Captain America: The Winter Soldier – 2014)
O Capitão América dos quadrinhos nasceu apenas como um símbolo de esperança na
Segunda Guerra, com um desenvolvimento narrativo tolo e que só encontrou alguma
relevância nos dez anos de domínio criativo do escritor Mark Gruenwald,
especialmente no arco em que o personagem questionava duramente o próprio
governo que defendia, levando-o a refletir sobre a ideologia que o mantinha
íntegro perante a óbvia manipulação de seus superiores. E uma das coisas que
mais me agradaram em “Capitão América 2: O Soldado Invernal” foi perceber esse
tom corajoso no filme, um posicionamento crítico político verossímil e análogo
ao que os jornais nos apresentam diariamente, como nas melhores mitologias
através dos tempos.
A Marvel entrega, num equilíbrio perfeito dessa vez, o que a DC/Warner está
tentando de forma desesperada, mas não consegue: um projeto que respeita
fielmente suas origens e seus leitores novos e antigos, com seriedade em
intensidade suficiente para ser relevante para todos os públicos, mas sem ser
sorumbático. O roteiro de Christopher Markus e Stephen McFeely inteligentemente
movimenta as peças desse grande tabuleiro que a produtora está criando, ousando
bastante nos plot twists e elaborando uma trama que caberia tranquilamente em
uma galeria ao lado das obras literárias de Robert Ludlum. É perceptível que os
diretores Anthony e Joe Russo, que haviam dirigido episódios das séries
“Community” e “Arrested Development”, estudaram bastante os filmes de Michael
Mann, para comporem as ótimas cenas de ação, nunca distribuídas em detrimento
do desenvolvimento narrativo, como é usual no subgênero “adaptações de
quadrinhos”. Cada uma delas existe com uma função lógica no contexto que o
roteiro propõe, normalmente utilizando as emoções dos personagens como elemento
motivacional, algo mais raro ainda caso levemos em consideração que o próprio
filme anterior era, estruturalmente, um videogame ruim.
Chris Evans (Steve Rogers), sendo um ator mediano, consegue transmitir
naturalmente o desconforto de um homem preso em um tempo que não é o dele,
defendendo noções éticas ultrapassadas em uma sociedade hipócrita. E o fator
mais interessante no personagem, mesmo nos quadrinhos, é esse conflito interno
entre a segurança de um militar e seu caráter, que o faz entender que ele vive
por regras já há muito tempo modificadas por interesses escusos. Sem me
aprofundar na trama, por respeito à experiência do público, descobrimos que nem
a S.H.I.E.L.D. estava imune à corrupção, introduzindo espertamente o personagem
vivido por Robert Redford (Alexander Pierce). O renomado ator que, em décadas
passadas, sempre foi cogitado pelos fãs para interpretar o herói, entrega uma
atuação segura, contida. Nada melhor que o protagonista de um dos melhores
thrillers de espionagem da década de setenta: “Três Dias do Condor”, estar
presente nessa homenagem ao gênero. Anthony Mackie (Sam Wilson) e Scarlett
Johansson (Natasha Romanoff) acabam sendo responsáveis pelos vários alívios
cômicos, com o primeiro especificamente resultando um tanto quanto caricatural,
o ponto mais fraco.
O melhor de tudo é constatar ao final, o que inclui as já costumeiras cenas
pós-créditos, um desejo genuíno de saber o que está por vir na sequência. Pela
primeira vez nesse universo cinematográfico da Marvel, não serão apenas os
fanboys que estarão salivando de ansiedade ao final. Quem diria, o personagem
mais fraco dos “Vingadores” protagonizou um projeto melhor que o próprio filme
da equipe.
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