Elvis havia conseguido provar aos críticos seu talento como ator em seu filme anterior: “Balada Sangrenta”, mas perdeu dois anos sendo domado, acorrentado ao serviço militar, longe de seu público. O cenário musical havia mudado bastante, Chuck Berry estava preso, Little Richard estava num monastério, Buddy Holly estava morto.
O jovem viu a necessidade de se reinventar enquanto artista, expandindo seu carisma para além da atitude roqueira, demonstrando abrangência vocal ao entoar a operística “It’s Now or Never” (O Sole Mio) e abraçando o tipo de produção cinematográfica que poderia se encaixar perfeitamente ao estilo de seu ídolo Dean Martin, a comédia musical romântica. Com “Saudades de Um Pracinha”, Elvis deixou o nicho de rebeldia adolescente e conquistou um público que era formado por crianças, pais e avós.
Saudades de Um Pracinha (G.I. Blues – 1960)
Tulsa McLean (Elvis) é um soldado cujo maior sonho é ser dono de um “Night Club”. Para conseguir o valor em dinheiro para que ele possa abrir o seu empreendimento, ele aceita participar de uma aposta, onde, na qual, ele deve passar uma noite com uma bailarina famosa (Juliet Prowse) no local, porém, os dois acabam se apaixonando.
Com o sucesso avassalador de “Ama-me com Ternura” (Love Me Tender – 1956), uma produção de baixo orçamento, os estúdios perceberam que havia um forte potencial financeiro nos projetos direcionados aos adolescentes americanos. Os produtores entenderam o clamor dos jovens, interessados principalmente em retirá-los de frente da televisão, essa invenção que estava tirando o sono dos executivos de cinema, focando toda atenção nesse cantor extremamente carismático que os levava a assistir diversas vezes suas produções, qualquer que fosse o nível do entretenimento em que estivesse inserido.
“G.I. Blues” era o quinto filme na carreira do cantor, um retorno muito aguardado pelos fãs e curiosos, algo que motivou até mesmo um especial televisivo onde Frank Sinatra se encarregava de dar as boas-vindas ao pracinha roqueiro. A Paramount não poupou despesas, aceitando o risco de que os jovens americanos já não estariam mais tão interessados no rapaz de Tupelo, Mississippi. O produtor Hal Wallis se encarregava de filmar algumas locações na Alemanha, enquanto Presley ainda tinha seis meses de serviço militar pela frente. O investimento era considerável, acreditando que a ausência do astro na mídia durante aquele longo tempo teria servido para aumentar o mito do artista.
O diretor escolhido foi o veterano Norman Taurog, que havia sido um dos responsáveis pelo clássico “O Mágico de Oz”, além de ter comandado comédias de Bing Crosby e da dupla Martin/Lewis, como “O Meninão” e “O Rei do Laço”. Em entrevistas à época das filmagens, o diretor louvava a educação do jovem e sua sensibilidade como bom ouvinte, qualidade essencial de um bom ator. Sua relação com Elvis foi tão bacana que ele acabaria dirigindo mais oito produções protagonizadas pelo Rei do Rock.
O conceito inicial previa uma comédia musical com uma trilha sonora que abraçasse diversos gêneros, evidenciando a versatilidade de um cantor que havia aprimorado bastante seu talento desde seus primeiros escandalosos rebolados em rede nacional. Com impecável entrega, Elvis revisitou o rock embrionário de Carl Perkins “Blue Suede Shoes”, o rockabilly diluído de “Shoppin’ Around”, o bate-estaca divertido de “Frankfurt Special”, a balada romântica em “Doin’ the Best I Can” e “Pocketful of Rainbows” (de Ben Weisman e Fred Wise), e, versátil como nunca antes, foi da música de ninar “Big Boots” a uma versão da clássica opereta “Barcarola” de Jacques Offenbach: “Tonight’s So Right For Love”, passando com desenvoltura por “Wooden Heart”, baseada em uma tradicional canção folclórica alemã, além da marchinha militar “Didja Ever” que finaliza a obra, sempre com um sorriso contagiante no rosto.
É interessante notar o gradativo desinteresse do astro ao longo de sua década dedicada quase que exclusivamente à Hollywood, especialmente após 1965, onde era cada vez mais raro perceber alegria genuína em suas atuações. A ótima seleção musical é encabeçada por “G.I. Blues”, uma das pérolas subestimadas de Elvis na década de sessenta, especialmente o registro do sexto take, a versão que deveria ter sido a master, lançada comercialmente em uma caixa de CD’s alguns anos atrás.
Vale destacar a ótima fotografia, de Loyal Griggs, responsável também pela obra-prima “Os Brutos Também Amam”. O filme foi um sucesso de bilheteria, tendo recebido críticas favoráveis e até uma importante indicação ao “Writers Guild of America”, como “Melhor Roteiro de Musical”, além da indicação ao Grammy como “Melhor Trilha Sonora”.
A parceria em cena com a bela dançarina Juliet Prowse pode ser considerada apenas um degrau abaixo da química que ele alcançaria anos depois com Ann-Margret em “Amor a Toda Velocidade” (Viva Las Vegas – 1964). Ela era namorada de Frank Sinatra na época, o que não intimidou o jovem, que teve um caso com ela durante as filmagens.
Era indiscutível que aquele garoto rebelde que havia revolucionado o mundo com sua música havia se tornado um adulto sofisticado, um genro que toda mãe gostaria de ter. Mas essa constatação não diminui o brilho de seu carisma em cena, capaz de carregar nas costas uma produção.
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