Críticas

Tesouros da Sétima Arte – “A Navalha na Carne”, de Braz Chediak

A Navalha na Carne (1969)

Num subúrbio do Rio de Janeiro, Norma Suely (Glauce Rocha) é uma mulher da vida oprimida pelo objeto de sua paixão, o cafetão de baixo nível, Vado (Jece Valadão). Certo dia, ao chegar de madrugada aos aposentos de Norma, em busca de dinheiro, Vado descobre que o mesmo havia desaparecido. Revoltado, ele a acusa pelo ocorrido, mas ela alega ter sido Veludo (Emiliano Queiroz), que mora no quarto ao lado, quem deu sumiço ao dinheiro.

Com essa pérola do nosso cinema, o diretor Braz Chediak conseguiu estabelecer um clima opressivo praticamente insuportável, primando por planos fechados e longos planos-sequência, com uma sábia utilização do silêncio, que vai além dos quase trinta minutos iniciais só com sons diegéticos.

O texto corrosivo de Plínio Marcos, defendido de forma naturalista pelo trio: Jece Valadão/Glauce Rocha/Emiliano Queiroz, vai preenchendo e consumindo o claustrofóbico ambiente, o quarto fétido e desorganizado que serve como microcosmo de uma sociedade hipócrita.

Os conflitos originados por atos de pura mesquinharia ocasionando em agressões gratuitas, como um câncer que lentamente se espalha pelo organismo. O cafetão que sente prazer em humilhar sua funcionária, extravasando com violência, física e psicológica, um desejo enrustido por outro homem, elemento sugerido em diversas cenas, apontando com sadismo os sinais de envelhecimento precoce na mulher que vive da aparência.

Neste quarto de pensão, o ódio coletivo, que nasce da insatisfação social e do desgaste natural diante dos rituais vazios, conduz os personagens ao limite da resistência. O silêncio durante todo o primeiro ato, mais do que um recurso de estilo, serve também, com sua antinaturalidade, para enfatizar a característica metafórica de cada diálogo posterior.

Todos os sentimentos são meticulosamente potencializados, pois não se trata de um simples caso que poderia estampar a manchete de um jornal sensacionalista, mas sim, um Álamo existencial, seres cansados buscando evitar a iminente extinção decorrente da evolução natural.

Eles expurgam as verdades de seus lábios, suas palavras como facas afiadas, como navalha na carne, pois sabem que, naquela sociedade corrupta em formação, apenas a mentira iria sobreviver. “Navalha na Carne”, essa obra-prima do cinema nacional, merece ser mais valorizada.

Octavio Caruso

Viva você também este sonho...

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  • Obrigado, Octavio Caruso.
    Espero que todos, principalmente os cineastas, descubram este filme que fizemos numa época difícil para o país.

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