Cinzas e Diamantes (Popiól i Diament – 1958)
O falecimento do diretor polonês me fez rever boa parte de sua filmografia, inclusive o meu favorito: “Cinzas e Diamantes”, desfecho de sua trilogia da guerra, ambientado no crepúsculo da Segunda Guerra Mundial, em um único dia intenso na vida do jovem Macieck, vivido por Zbigniew Cybulski, que veste jeans e tem a aparência rebelde de um James Dean, mas sua forma de expressão é uma metralhadora, o seu alvo: um chefe comunista.
Na sequência inicial o vemos com seus comparsas da resistência compartilhando a tranquilidade ilusória que antecede a tempestade, aguardando em uma capela a passagem da vítima. A figura de uma menina, a pureza de uma criança que se aproxima do local, acaba se revelando traiçoeira, uma emboscada. Não há elemento puro na sociedade. Em frente às imagens religiosas, o batismo de fogo, morte e frustração, o alvo foge.
Impetuoso, o rapaz luta para manter viva sua ideologia, mas o choque de realidade o conduz inexoravelmente à reflexão sobre a incoerência do radicalismo daqueles que são regidos por palavras de ordem, aqueles que lucram enquanto posicionam seus peões no tabuleiro. Ao se hospedar no hotel onde está o seu alvo, para tentar finalizar sua missão, uma despretensiosa passada no bar do estabelecimento se torna um convite irrecusável para uma segunda chance na vida.
Macieck se encanta com a bela atendente, vivida por Ewa Krzyzewska, mulher misteriosa que parece viver à espreita de seus próprios sentimentos, engaiolada na desesperança. Ela resiste bravamente aos galanteios desajeitados dele, mas a carência emocional fala mais alto e os dois se encontram no quarto escuro, o rapaz descobre que o desordenado balé dos corpos é mais interessante que acatar a rigidez nas ordens de seus superiores, o medo de perder aquela cumplicidade terna passa a dominar sua mente, a possibilidade da morte no cumprimento do dever deixa de ser algo aceitável, não há causa que seja mais sincera que o amor.
A mensagem que Wajda transmite é essencialmente humanista, a eficiência na execução é o que me faz rever a obra. As ideologias políticas desvalorizam as perdas humanas como bucha de canhão, estatísticas necessárias na obtenção do resultado desejado, mas aquele que perde a empatia, aquele que não se comove com a morte de um simples indivíduo, aquele que não entende o peso existencial de se apertar o gatilho, não está preparado para a guerra. Nas cinzas da destruição, os diamantes brutos são todos os que rejeitam a indiferença, lapidados pela experiência de se manterem eretos quando o mundo parece ordenar que se curvem.
Estes valorosos indivíduos, os que resistem à selvageria, forjam o terreno por onde a esperança orgulhosamente caminha. Já os corrompidos, como loucos em um hospício, na famosa sequência ao som da Polonaise de Chopin, dançam inebriados na celebração da hipocrisia, o nascimento de um novo regime que irá explorar novos peões. O herói redimido morre de pé, tendo a consciência de que, ainda que por um único e intenso dia, ele viveu.
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