Por razões que nunca consegui entender muito bem, “O Seresteiro de Acapulco” é o filme de Elvis mais popular no Brasil. As várias exibições na televisão com certeza ajudaram, mas considero um dos momentos menos interessantes do cantor no cinema, as canções são quase todas ruins (até para os padrões dos filmes posteriores), a disposição delas na trama é bastante preguiçosa, o arco narrativo do protagonista é absurdo demais, até para os padrões dos filmes protagonizados pelo cantor na época.
Um trapezista norte-americano de circo traumatizado após um acidente acaba trabalhando como salva-vidas nas piscinas de um hotel em Acapulco, faz amizade com uma criança esperta que se torna seu empresário quando aproveita para ganhar mais uns trocados como cantor à noite, até que conhece uma jovem que o ajuda a encarar seu medo de altura e pular do penhasco La Quebrada, após várias tentativas frustradas de saltar nas piscinas. Nada faz sentido…
O Seresteiro de Acapulco (Fun in Acapulco – 1963)
Allan Weiss, responsável pelo roteiro de “Feitiço Havaiano” e “Garotas, Garotas e Mais Garotas”, não estava muito inspirado, mas merece crédito por inserir na trama um deboche nada sutil ao empresário de Elvis, o Coronel Parker, na figura do pequeno Raoul (Larry Domasin), o mercenário de oito anos de idade que consegue garantir das formas mais absurdas remunerações polpudas para seu cliente informal. A fórmula de sucesso avançava com a adição do elemento de parceria infantil, algo que havia dado certo no projeto anterior, mais um passo na domesticação da persona cinematográfica do cantor.
Elvis, contra sua vontade, não chegou a pisar em Acapulco, o excesso de cenas com trucagem visual prejudica ainda mais a imersão, assim como o baixo nível da atuação dos coadjuvantes, como Elsa Cárdenas, vivendo uma toureira oferecida, e Alejandro Rey, o mais próximo de um antagonista que a história entrega. Até mesmo Ursula Andress, que havia acabado de ganhar fama mundial como a namorada de James Bond em “007 Contra o Satânico Dr. No”, não consegue disfarçar a ausência de química com seu parceiro de cena, o que tira qualquer organicidade das sequências românticas.
A trilha sonora tenta captar a essência latina que já contaminava o trabalho de Elvis na RCA, em discos como “Pot Luck”, mas soa genérica e sem brilho, letras terríveis como “No Room to Rhumba in a Sport’s Car”, “Mexico” e “The Bullfighter Was a Lady”, ou grandiosas bobagens como “El Toro” e “Marguerita”, dividem espaço com uma versão desajeitada de “Guadalajara” e uma canção-título que brinca sem muita criatividade com expressões latinas, tudo bastante pueril. O único tesouro, “Bossa Nova Baby”, composta pelos craques Jerry Leiber e Mike Stoller, emoldura uma das sequências de dança mais memoráveis do cantor, verdadeiramente empolgante.
A fotografia de Daniel L. Fapp, premiado pelo trabalho em “Amor, Sublime Amor” e recém-saído de “Fugindo do Inferno”, garante um visual mais elegantemente elaborado (ele enriqueceria também “Spinout” e “Double Trouble”), enquanto a direção do competente Richard Thorpe, que já havia trabalhado com Elvis em “O Prisioneiro do Rock”, consegue manter o clima agradável e leve. O resultado é satisfatório, o filme agradou muito, foi a maior bilheteria de um musical no ano, mas o desgaste já era evidente.
Alguns meses depois, os Beatles invadiriam os Estados Unidos, o cenário musical mudaria drasticamente, os jovens, que viram seu ídolo rebelde se transformar no comportado galã de roteiros cada vez mais bobos, agora vibravam pelos quatro rapazes de Liverpool. Elvis, muito incomodado, preso com os contratos em Hollywood, já não acreditava mais que a indústria permitiria que ele abraçasse papeis dramaticamente desafiadores.
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