Críticas

“Em Ritmo de Fuga”, de Edgar Wright, na NETFLIX

Em Ritmo de Fuga (Baby Driver – 2017)

Baby é um motorista de fuga que está em dívida com um chefão do crime. Ele só precisa fazer mais um trabalho, mas é agora que tudo vai dar errado.

Analisando unicamente a trama, “Em Ritmo de Fuga” não traz nada novo, ou especialmente interessante, não é esta a proposta. É em essência, algo explícito já na arte do pôster, uma nostálgica homenagem a filmes e videogames em que o automóvel é figura central, como “Driver”, “Grand Theft Auto”, “Operação França” (1971), “Mad Max” (1979), “Bullitt” (1968), “The Driver” (1978), “The Blues Brothers” (1980) e ao gênero de filmes de assaltos.

O jovem protagonista, Baby, vivido por Ansel Elgort, sofreu um acidente de carro na infância que o deixou com um zumbido permanente no ouvido, problema que ele ameniza escutando música o tempo todo.

Ele trabalha para um gângster como motorista de fuga, com uma frieza impressionante, não há emboscada que ele não consiga reverter com as mãos firmes no volante e a canção certa tocando no iPod. Os tipos criminosos que ele ajuda são caricaturas hilárias de personagens durões do cinema dos anos 80, com destaque para Jamie Foxx e Jon Hamm.

O chefe do bando, mais uma aula minimalista de Kevin Spacey, pensa controlar o rapaz, mas, na realidade, faz parte dos experimentos das fitas de remixes preparadas por Baby, que, ao registrar secretamente diálogos comuns, frases simplórias, cria música a partir do cotidiano, tentando trazer ordem ao caos.

Como ele se sente culpado por não ter podido fazer nada para salvar os pais na infância, ele conquista algum conforto nesta despretensiosa alquimia sonora. Quando o amor de uma garçonete, bela Lily James, apresenta novas possibilidades, ele começa a repensar suas escolhas perigosas.

A genialidade do filme está na forma como a trilha sonora exerce papel fundamental em cada cena, nos momentos grandiosos e naqueles aparentemente irrelevantes. O próprio título do filme faz referência a uma canção de Simon and Garfunkel.

O som é o coração pulsante da obra, todas as decisões criativas da direção são pensadas como coreografia musical, cada freada do carro sincronizada com a batida, o ritmo dos tiros disparados em uma sequência frenética rima com a trilha, o gestual de um personagem está em harmonia com a letra, o movimento dos corpos responde diretamente ao estímulo sonoro, enfim, um trabalho minucioso e esteticamente muito original.

Edgar Wright é um diretor muito competente por entender que a montagem, até mesmo o enquadramento, podem servir à comédia, ele não fica refém do texto. Ao administrar com inteligência este aspecto ele consegue, como um maestro de orquestra, manipular o ritmo e evoluir a narrativa sem recorrer à diálogos expositivos, criando uma linguagem própria altamente intuitiva e universalmente compreensível.

Octavio Caruso

Viva você também este sonho...

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