Eu cresci jogando os três primeiros títulos da Capcom, ficava apavorado cada vez que o Nemesis aparecia no terceiro, adorei a versão remasterizada do original que jogava no lixo aquelas inserções iniciais em live action vergonhosas, em suma, nutro carinho nostálgico por “Resident Evil”.
Não acompanho mais como jogador, eu parei no terceiro, mas tenho eles no PS3, de vez em quando mato a saudade. Eu teria todos os motivos para desprezar as adaptações para o cinema. Os roteiros têm furos gigantescos, estabelecem regras que são desrespeitadas posteriormente, esquecem de fatos importantes e frequentemente reescrevem a história, personagens importantes do jogo são inseridos, visualmente fiéis, mas sem qualquer relevância e, para piorar, somem sem explicação, abusam da clonagem como reviravolta pífia e os diálogos são uma colcha de retalhos de frases de efeito. Ok, senhor juiz, este é um caso muito difícil de defender, mas há um elemento que redime todos os equívocos: Milla Jovovich.
Foi paixão cinematográfica à primeira vista, depois que a conheci em “O Quinto Elemento”, eu pagaria ingresso para vê-la encarando a câmera por três horas enquanto lê um dicionário. O roteirista/diretor Paul W. S. Anderson é seu marido na vida real e eu compreendo perfeitamente porque ele faz desta franquia uma reverência apaixonada à sua musa, apesar da personagem Alice simplesmente não existir nos jogos. Ela é linda, ótima atriz e uma pessoa extremamente gentil, basta você procurar os vídeos de entrevistas, a forma carinhosa como ela trata os fãs da franquia, sem estrelismo, sem frescura, aquela simpatia natural cada vez mais rara na indústria.
Como crítico de cinema, eu escrevi sobre alguns filmes da série, os elogios foram poucos, a minha crítica para o quinto pode levar qualquer pessoa a acreditar que eu odiei a experiência. É o trabalho do crítico apontar falhas, mas um ponto fascinante nesta arte é que, mesmo consciente de que são filmes fracos e com sérios problemas, você ainda pode se divertir sobremaneira com eles. Não é sempre que isto acontece, por exemplo, eu consigo até suportar “Transformers”, que vejo como uma comédia sexual adolescente que faz o possível com sua trama absurdamente estúpida, mas as sequências me causam ânsia de vômito, ou “Velozes e Furiosos”, que com exceção do primeiro e do quinto, altamente competente filme de ação, são irritantemente superficiais. Já com “Resident Evil”, os seis são despretensiosos filmes B, curtos e objetivos, que entregam exatamente aquilo que prometem.
Vale destacar que as tramas dos jogos originais não são lá grande coisa, o que os torna memoráveis é a dinâmica, o tom, o senso de ameaça, o conceito narrativo criado para os filmes é muito mais instigante e universalmente atraente. E, claro, não custa repetir, são protagonizados pela Milla Jovovich. I rest my case.
Resident Evil: O Hóspede Maldito (Resident Evil – 2002)
O diretor havia sido o responsável pela melhor adaptação de videogame até aquele momento, “Mortal Kombat”, logo, a esperança era forte. E, sejamos sinceros, os equívocos são poucos nesta primeira aventura. A essência do jogo foi respeitada, a trama ainda se preocupava em respeitar algumas convenções do horror, apesar do nível de gore ser comportado demais, entretenimento acima da média valorizado por sequências criativas, como a da armadilha laser no corredor.
O que poucos lembram é que a tendência atual de protagonistas femininas em filmes de ação mainstream deve muito à “Resident Evil”. Após o sucesso da Ripley de “Alien” e sua sequência marombada, a indústria flertou poucas vezes com heroínas fortes. A franquia não trazia apenas uma protagonista poderosa, as coadjuvantes também foram marcantes.
Resident Evil 2: Apocalipse (Resident Evil: Apocalypse – 2004)
A ideia por trás da presença de Nemesis é muito mais interessante no filme do que no jogo, o roteiro insere uma camada emocional que o torna relevante, não apenas um monstro unidimensional. Alice teve seus genes modificados, ela se torna uma espécie de Jedi. Jill Valentine, a personagem mais famosa dos jogos, faz sua estreia no cinema sendo vivida por Sienna Guillory, mas a sua figura é tão estereotipada que destoa da abordagem mais naturalista dominante. É meio frustrante ver Nemesis e Alice saindo no braço, o filme falha terrivelmente em captar o senso de ameaça do vilão no terceiro jogo.
Resident Evil 3: A Extinção (Resident Evil: Extinction – 2007)
Se você ignorar que neste cenário apocalíptico em que os sobreviventes lutam diariamente no deserto, todos estão maquiados e vestidos como se estivessem preparados para um desfile de moda, com penteados impecáveis e rostos limpos, talvez você possa enxergar que este é o melhor filme da franquia, o mais consistente, mérito da direção do experiente Russell Mulcahy, de “Highlander – O Guerreiro Imortal”.
Ainda bem que aprenderam anos depois com “Mad Max: Estrada da Fúria”, abandonaram o estilo novela bíblica brasileira e optaram no sexto (antes tarde do que nunca) por uma paleta suja, compreendendo que um figurino realista é fundamental na imersão dos espectadores, especialmente quando o roteiro não prima pelo brilhantismo.
Resident Evil 4: Recomeço (Resident Evil: Afterlife – 2010)
A grande sacada destes três últimos projetos é a esperta utilização do 3D, inegável que Anderson é um mestre nesta arte, ele consegue trabalhar o recurso em cenas escuras, com edição frenética, sem causar ataques epiléticos na plateia.
Assistido em casa, perde um pouco do encanto, mas abandonando as amarras de qualquer senso lógico e metendo o pé no acelerador, o filme aproveita a química da dupla Jovovich e Ali Larter, que vive Claire Redfield, um dos pontos altos do anterior, inserindo também mais um monstro visualmente impactante, o gigante do machado. A cena em que as duas enfrentam o vilão no banheiro da prisão da penitenciária é espetacular.
Resident Evil 5: Retribuição (Resident Evil: Retribution – 2012)
Com um orçamento maior e uma direção de arte inspirada, Anderson consegue elevar o escopo da ameaça para uma escala mundial, mas o roteiro raso falha em acompanhar esta escalada. É o filme da franquia com mais cara de videogame, episódico, exagerado, com algumas escolhas tolas e desnecessárias, como a ideia de iniciar com uma cena de ação de trás para frente.
O ponto alto foi inserir na jornada de Alice uma criança em perigo. Pode ser clichê, mas é bonita a cena em que a menina desesperada pergunta se ela é mesmo sua mãe, já que acaba de descobrir a fábrica de clones com suas réplicas. “Blade Runner” bastante diluído, com dose generosa de açúcar.
Resident Evil 6: O Capítulo Final (Resident Evil: The Final Chapter – 2016)
O roteiro injeta uma sempre bem-vinda crítica à religião organizada na figura do Dr. Isaacs, vivido por Iain Glen, espécie de Richard Chamberlain genérico, que já havia sido assassinado no terceiro, mas que voltou porque ficou mundialmente famoso com “Game of Thrones”. O tom e o trabalho de câmera ainda mais frenético que o usual na franquia foram claramente inspirados em “Mad Max: Estrada da Fúria”.
É engraçado que o início ignora completamente o gancho deixado no final do anterior, resolvendo tudo com uma linha de diálogo jogada no terceiro ato. A reviravolta final é bacana, apesar de não surpreender, já que o roteiro entrega o mistério logo nos primeiros minutos em flashback. Há a sugestão de sacrifício pela salvação da humanidade, elemento clássico, mas Anderson se recusa a eliminar sua esposa na tela grande. Eu não o culpo, terminar com Milla Jovovich sorrindo para a câmera é sempre o melhor caminho.
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