Amores de Chumbo (2017)
Quarenta anos separam Maria Eugênia, ou Maê (Juliana Carneiro da Cunha), escritora pernambucana radicada na França, do casal Miguel (Aderbal Freire-Filho) e Lúcia (Augusta Ferraz), que acaba de comemorar união matrimonial de quatro décadas. Miguel é ex-preso político, Lúcia lutou para tirá-lo da cadeia. É pelo ponto de vista destes três personagens centrais que revivemos a história política e social dos anos de chumbo.
A diretora pernambucana Tuca Siqueira entrega seu primeiro trabalho de ficção esbanjando competência, alicerçada por atuações inspiradas de todo o elenco, com destaque para a naturalidade eficiente de Aderbal Freire-Filho. O roteiro, escrito por ela em parceria com Renata Mizhari, encontra significados pungentes nos pequenos momentos, aparentemente despretensiosos, como naquele que exibe a apatia dos alunos contrastando com o sangue nos olhos do professor Miguel em uma cena motivada pelo leitmotiv do significado da “verdade”. Uma geração perdida e preguiçosa que está preparada para seguir cegamente qualquer líder carismático, do mais caricato youtuber ao engravatado político.
Algumas escolhas estéticas não funcionam tão bem, como, por exemplo, cenas que se estendem desnecessariamente, como o passeio de Maê pela cidade acompanhada pela câmera no ombro, ou aquela que mostra Miguel aguardando a neta tomar sorvete, injustificáveis 45 segundos, opções que parecem existir apenas para ajudar a preencher a duração de um longa-metragem. O conceito de “esculpir o tempo” defendido por Tarkovski não é válido se o espectador estiver dormindo. Sempre que a trama se afasta do material humano, apostando em firulas visuais que não evoluem a narrativa, revela insegurança. A história, por si só, já é bastante interessante. Há também uma esquisita transição entre plano externo e interno durante a primeira conversa entre Miguel e Maê, recurso que serve apenas para distrair a atenção e, por conseguinte, diminuir o impacto de um momento emocionalmente forte, apesar de executado inteligentemente com sutileza. Por outro lado, o silêncio é trabalhado brilhantemente na sequência em que Maê se olha no espelho, fantasiando uma barriga de grávida, e, logo depois, lacrimosamente tampando seus olhos. A simbologia diz muito sobre a personagem.
O filme merece maior reconhecimento, a sensibilidade que a diretora evoca ao tocar no amor por baixo dos escombros das vidas do casal é um sopro de ar fresco na cinematografia nacional atual.
Cotação:
Jurado Nº 2 (Juror #2 - 2024) Pai (Nicholas Hoult) de família serve como jurado…
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