É muito comum encontrar em listas cinematográficas abordando a obra de Nietzsche alguns títulos equivocados, escolhas aparentemente óbvias, mas que são a antítese do que ele defendia.
Eu tentei evitar filmes muito óbvios (e corretos no tema), ou diretamente relacionados à ele, explorando de forma mais abrangente projetos essencialmente nietzscheanos. Estudo o filósofo desde a adolescência, o meu primeiro curta-metragem como roteirista/diretor recebeu o título: “Übermensch”, logo, acho que já é hora de eu, como crítico de cinema, dar minha contribuição.
Um Estranho no Ninho (One Flew Over the Cuckoo’s Nest – 1975)
Randle Patrick McMurphy (Jack Nicholson), um prisioneiro, simula estar insano para não trabalhar e vai para uma instituição para doentes mentais, onde estimula os internos a se revoltarem contra as rígidas normas impostas pela enfermeira-chefe Ratched, mas ele não tem ideia do preço que irá pagar por desafiar uma clínica “especializada”.
O protagonista é derrotado pela impassividade, ele se recusa a se dobrar diante da figura de autoridade. Ele é um rebelde que se opõe a tudo que impede o progresso. Nietzsche, assim como Foucault, criticava as instituições sociais (ferramentas de repressão), representadas na obra pelos terríveis métodos utilizados pela enfermeira-chefe, vivida por Louise Fletcher.
Amnésia (Memento – 2000)
Após um assalto que resultou na perda de sua esposa e que o deixou em estado gravíssimo, Leonard Shelby (Guy Pearce) passa a sofrer de amnésia recente. Ele não consegue se lembrar de fatos que aconteceram há 15 minutos. Mesmo assim ele decide ir atrás do responsável e se vingar. O protagonista utiliza sua perda de memória de curto prazo para introduzir um significado arbitrário para o ato de existir.
O Sacrifício (Offret – 1986)
Família burguesa sueca celebra o aniversário do patriarca Alexander, escritor e ator aposentado. Tudo muda com a notícia do início da Terceira Guerra Mundial. A obra de Tarkovski fala diretamente ao conceito do Eterno Retorno do Mesmo, como trabalhado por Nietzsche inicialmente em “Gaia Ciência”.
Rashômon (1950)
O roteiro descreve crimes através dos relatos amplamente divergentes de quatro testemunhas, incluindo o próprio criminoso e, através de um médium (Fumiko Honma), a própria vítima. A história se desvela em flashbacks conforme os quatro personagens — o próprio bandido (Toshiro Mifune), o samurai eliminado (Masayuki Mori), sua esposa (Machiko Kyō) e o lenhador sem nome (Takashi Shimura) — recontam os eventos de uma tarde em um bosque. Simplesmente o melhor trabalho já feito abordando o perspectivismo moral desenvolvido por Nietzsche, a partir dos estudos de Leibniz.
2001 – Uma Odisseia no Espaço (2001 – A Space Odissey – 1968)
Desde a “Aurora do Homem” (a pré-história), um misterioso monólito negro parece emitir sinais de outra civilização interferindo no nosso planeta. Quatro milhões de anos depois, no século XXI, uma equipe de astronautas liderados pelo experiente David Bowman (Keir Dullea) e Frank Poole (Gary Lockwood) é enviada a Júpiter para investigar o enigmático monólito na nave Discovery, totalmente controlada pelo computador HAL 9000.
Nas palavras do próprio diretor Stanley Kubrick: “Alguém disse que o homem é o elo perdido entre os macacos primitivos e os seres humanos civilizados. Somos semicivilizados, capazes de cooperação e afeto, mas precisando de algum tipo de transfiguração para uma forma de vida superior. O homem está realmente em uma condição muito instável”. O bebê-estrela é uma direta referência à seção “Das Três Transmutações”, do livro “Assim Falou Zarathustra”.
O Silêncio dos Inocentes (The Silence of the Lambs – 1991)
Clarice Starling (Jodie Foster), agente novata do FBI, procura por um criminoso que ataca mulheres jovens. Para construir o perfil psicológico deste homem, recorre à ajuda de um condenado que agia de forma semelhante. O dr. Hannibal Lecter (Anthony Hopkins) pode ajudar na investigação, mas quer em troca um local mais confortável para ficar preso. E quer também se aproximar da durona Clarice, para que ela fale de seus traumas e revele seu lado vulnerável.
O personagem Hannibal Lecter se considera um “übermensch” nietzschiano, ele não comete crimes por dinheiro, vingança, ou pura loucura. Tudo o que ele faz visa apenas afirmar sua superioridade intelectual.
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