Gabriel e a Montanha (2017)
Antes de entrar para uma prestigiada universidade americana, Gabriel Buchmann (João Pedro Zappa) decide tirar um ano para circundar o mundo. Depois de dez meses de viagem e imersão no coração de muitos países, ele decide visitar o Quênia, para descobrir o continente africano, até escalar o Monte Mulanje, no Malawi, seu destino final.
Começando pelos pontos negativos, não posso deixar de salientar uma extremamente desnecessária cena em que o protagonista degola um coelho na selva do Quênia, logo na primeira meia-hora de filme. É material que caberia em um filme de terror como “Cannibal Holocaust”, mas que, nesta produção que se orienta pela sensibilidade, não avança a narrativa e serve apenas como elemento grotesco que afasta o espectador. Vale destacar que todo o primeiro ato é tremendamente arrastado, com sérios problemas de ritmo, graças (em boa parte) ao prolongamento exagerado de planos panorâmicos, recurso usual nas produções indie mais caricaturais.
Se o foco da obra é celebrar a curta vida real do protagonista, teria sido mais inteligente utilizar o tempo na humanização de Gabriel, talvez contextualizando melhor a motivação que o levou a empreender viagem, evitando firulas de estilo e sequências de sexo desajeitadamente filmadas. A opção de inserir discursos políticos de forma pouco orgânica, como no passeio de ônibus em que o jovem entra em conflito com sua namorada Cristina (Caroline Abras), esvazia ainda mais a trama, inclusive trabalhando contra o próprio personagem, já que exibe apenas uma personalidade irritante, irresponsável, mimada e de temperamento quase sempre insuportável, dificultando o necessário processo de identificação com o público.
A utilização generosa na trama de pessoas reais que conviveram com o rapaz, não-atores, em teoria, favorece o aspecto documental, mas, na prática, desvia a atenção em momentos importantes, enfraquecendo a dramaticidade, um problema que, aliado à longa duração, prejudica a experiência. A situação melhora um pouco quando o roteiro, no segundo ato, abraça mais a estrutura tradicional e passa a dar atenção à interação entre Gabriel e sua namorada, tornada crível exatamente por ser pautada por uma dinâmica conflituosa. É uma pena que, já próximo do final, o roteiro deixe um pouco confuso para o público o aspecto sensorial, apressando a jornada final do jovem na montagem, falhando em transmitir a tensão, o desespero da situação. Da forma como é mostrada no filme, parece que a morte veio em questão de minutos após ele ficar perdido, sabotando a proposta principal do projeto.
É impossível não comparar com o superior irmão norte-americano “Na Natureza Selvagem”, mas, como ponto positivo, a produção nacional merece aplausos pela preocupação em estabelecer respeitoso retrato da cultura africana, sem clichês, sem simplismo, com o protagonista dedicado a viver em sua plenitude os costumes de cada povo.
Cotação:
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