Halloween – A Noite do Terror (Halloween – 1978)
Um maníaco retorna à sua cidade natal para continuar o terror que ele começou há quinze anos.
Michael Myers é um personagem importante não apenas no subgênero slasher, ele transcendeu o microcosmo das convenções de fãs e se tornou uma imagem facilmente identificável na cultura popular mundial. O segredo do sucesso da obra original é o mistério sobre sua motivação, não há lógica por trás de seus ataques, um enigma que seria explorado nas sequências, reduzindo o personagem à uma caricatura convencional e irrelevante.
A trilha sonora brilhante, simples e minimalista de John Carpenter reforça o modus operandi objetivo e eficiente, sem concessões, sem qualquer possibilidade de piedade. Uma força incontrolável, silenciosa e aparentemente imortal, mas você é lembrado frequentemente de que ele é humano porque consegue escutar sua respiração pesada, os passos lentos humanizantes que iludem as vítimas à pensarem que a fuga é possível, enquanto que o rosto, uma máscara lívida sem expressão, torna-se tela para que o público inconscientemente projete nela seus medos, seus demônios internos.
O filme opta por iniciar colocando o espectador na pele dele, que sorrateiramente adentra a casa, coloca uma máscara genérica de palhaço, sobe a escada e, sendo chamado pelo nome, detalhe inesperado, esfaqueia a bela mulher seminua que penteava o cabelo no quarto. Alguns segundos depois descobrimos que aquela era sua irmã e, pior, que o assassino é um menino de seis anos de idade.
Ao contrário dos gialli italianos, fonte de inspiração, Myers não é demonizado, o roteiro de Carpenter e Debra Hill parece buscar alguma empatia, como se, em essência alegórica, a perseguição dele representasse o desespero de um apaixonado por uma musa que o rejeita. Não é um demônio sobrenatural como Freddy Krueger, ou um zumbi abrutalhado como Jason Voorhees, aliás, franquias que só existiram graças ao sucesso de “Halloween”. Ele é, apesar de fisicamente ameaçador, intensamente patético.
Laurie Strode (Jamie Lee Curtis, em sua estreia no cinema) é uma adolescente gentil, responsável e introvertida que ganha uns trocados ajudando vizinhos como babá. Adorável, ela difere bastante de suas colegas de escola, provocadoras e, como é natural da idade, hipersexualizadas. A câmera inteligentemente dedica tempo generoso em tomadas à distância, em que acompanhamos caminhadas tranquilas dela voltando para casa, conseguimos quase sentir o aroma das árvores e o toque da brisa na pele, enxergamos claramente a apatia da vida na cidade interiorana. E, vale salientar, os enquadramentos agregam ao suspense, já que os nossos olhos buscam nos cantos, espaços vazios, alguma presença estranha.
A calmaria é mentirosa, sabemos que a jovem corre perigo. E, de certa forma, numa camada bizarra de interpretação, Myers é o responsável por retirá-la do conformismo existencial. Ela estava fadada à seguir o mesmo molde de sua mãe, diploma, marido e filhos, cuidar da casa e envelhecer diante do monitor da televisão, o futuro possível naquele local. Quando ele entra na equação, o “príncipe encantado do inferno”, a vida dela muda completamente, ela se fortalece com a experiência e, ao contrário de suas colegas que se consideravam tão espertas, Laurie sobrevive.
O doutor Sam Loomis (Donald Pleasence) é obstinado, ele sabe que seu paciente é o mal personificado. Ao testemunhar sua fuga na inesquecível sequência noturna nos arredores do hospital psiquiátrico, o experiente e cansado profissional sente a culpa indireta por não ter sido capaz de modificar aquele indivíduo. Aquele jovem que viveu preso, como que por mágica, aprendeu a dirigir o automóvel que o conduz à liberdade. A insinuação sobrenatural é algo que amedronta o próprio Loomis. A entrega do ator em todas as cenas transmite senso de urgência, com um toque de gênio, sem medo de fragilizá-lo ao deixar passar a perturbação que sente apenas em cogitar o reencontro.
Uma produção de baixíssimo orçamento feita cooperativamente por um grupo de amigos com pouca experiência na área, “Halloween” se tornou com o passar dos anos objeto de culto por fãs do mundo inteiro, iniciando uma franquia problematicamente fascinante e que, agora, quarenta anos depois de sua estreia, está prestes a entregar mais um capítulo, o décimo primeiro, protagonizado novamente por Jamie Lee Curtis, ignorando narrativamente as sequências (e, por conseguinte, anulando o conceito tolo de que Laurie é irmã de Myers) e retomando a história diretamente de onde o original terminou, projeto que já está sendo elogiado pela crítica internacional e estreia nos cinemas brasileiros em 25 de outubro.
Um clássico do terror que somente melhora a cada revisão.
Cotação:
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