Namorada de Aluguel (Can’t Buy Me Love – 1987)
Ronald (Patrick Dempsey) é um adolescente nerd que sempre sonhou em ser popular na escola. A oportunidade bate em sua porta quando a garota mais popular do colégio, Cindy (Amanda Peterson), entra em apuros ao sujar o casaco de camurça caríssimo de sua mãe. Como o casaco custa muito dinheiro, Ronald oferece a grana em troca dela fingir que os dois estão saindo.
Não poderia faltar este filme no especial em que resgato as minhas lembranças infanto-juvenis da “Sessão da Tarde” e “Cinema em Casa” (o título “Cine Bueller”, em homenagem ao personagem Ferris Bueller, de “Curtindo a Vida Adoidado”), eu me identificava intensamente com seu protagonista, Ronald, o rapaz nerd e introvertido. Na revisão para este texto, constatei feliz que o roteiro sobreviveu ao árduo teste do tempo, continua charmoso, ágil e genuinamente engraçado.
O primeiro ponto que saliento é a subestimada trilha sonora de Robert Folk, sempre eclipsada pela música-tema, o medalhão dos Beatles, que capta com perfeição jazzística o clima da obra, especialmente em faixas como “Rent Me”, “Siberia” e “Broken Moon”. O leitmotiv da trama é evidenciado em um detalhe, a jovem Cindy, apesar de preferir o conforto social dos grosseirões populares da escola, escrevia poemas, tinha uma essência frágil, vulnerabilidade que a saudosa atriz Amanda Peterson conseguiu entregar de forma impecável.
A sociedade empurrou ela na direção da futilidade, não é coincidência que o elemento que engatilhou toda a confusão tenha sido a apropriação desautorizada da roupa elegante da mãe. A necessidade de se adequar ao nível de suas colegas, fez com que ela arriscasse perder a confiança materna. O sonho de consumo do rapaz tímido era o telescópio, peça que não seria invejada por ninguém, escondida no quarto, mas que, alegoricamente, tiraria ele de sua clausura social, possibilitaria uma visão de longo alcance, a contemplação das infinitas possibilidades.
A exibição do ritual do tamanduá africano na festa escolar, talvez a sequência mais lembrada pelos fãs, também trabalha eficientemente no diapasão cômico esta questão crucial na maturidade emocional dos adolescentes. O aspecto patético de um grupo adotar imediatamente os movimentos de dança, somente por serem defendidos pelo aluno popular, aponta um dedo crítico ao comportamento de manada. Na cena, numa subversão espirituosa, o único que passa mal de tanto rir com aquele absurdo é o irmão mais novo, a criança, ainda intocada pelos rituais tolos e pela insegurança do mundo adulto. Ronald, já entorpecido com a fama, comete atos cada vez mais detestáveis, culminando no vandalismo noturno que humilha seu melhor amigo.
A forma como o roteiro desenvolve os personagens não é tão refinada quanto nos filmes de John Hughes, mas, aparando as arestas, o resultado mostra dois indivíduos, outrora puros, sofrendo as pressões sociais. Cindy e Ronald aprendem ao final do dia que o melhor caminho é ter empatia com as batalhas diárias de todos, a vida não é fácil para ninguém. E, principalmente, eles compreendem que precisam, acima de tudo, aliviar a autocobrança.
Cotação:
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