Guerra Civil (2010)
Portugal, 1982. O adolescente Rui (Francisco Belard) está passando o verão numa praia do Sul do país com a mãe (Catarina Wall). Enquanto o marido não chega, ela tem um caso com Zé (Nuno Romano), rapaz vinte anos mais novo. Mergulhado num mundo próprio, povoado de música e desenhos, Rui se distancia cada vez mais de tudo. A única coisa que parece despertá-lo do autismo é Joana (Maria Leite), moça cheia de vitalidade que o fascina.
O filme, que me remete à “Pauline na Praia”, de Éric Rohmer, ganhou o prêmio máximo no IndieLisboa e foi exibido no Festival do Rio, em 2010, quando tive o primeiro contato com o trabalho do diretor Pedro Caldas. O ritmo lento inicialmente parece não levar a lugar algum, longos silêncios e flertes sutis com o surrealismo, mas há um momento na trama em que o espectador percebe finalmente a engenhosidade da narrativa, que flui como ondas sem o peso da linearidade, com o foco sendo direcionado ao ponto de vista de mãe e filho, inseridos em uma realidade de intensa desilusão.
O filho adolescente, que lê “Arabian Sands”, de Wilfred Thesiger, identificando-se com o desejo de fugir do ambiente familiar, recebe reclamações constantes dos pais, um relacionamento visivelmente frágil, já que os adultos sequer conhecem seus anseios artísticos. Aos olhos deles, o rapaz é uma obrigação social que foi cumprida em algum ponto de suas vidas. O roteiro reforça isto ao repetir como mantra a limitada interação entre eles, que se resume à abaixar o volume do som e pedir que ele estude.
É como se Caldas estivesse incitando a reflexão no público: estudar, entrar no molde, cometer os mesmos erros, em suma, eles realmente se importam com o indivíduo isolado no quarto? Na realidade, analisando a apatia deles como casal, sustentando uma mentira na sociedade, o filme levanta o ponto de que a existência do jovem, para eles, não passa de punição, símbolo máximo de arrependimento, o fruto da aceitação dos rituais tolos. A figura leve e solar de Joana, vivida pela belíssima Maria Leite, representa a esperança de liberdade para o filho e, para os pais dele, o reflexo estilhaçado das promessas negadas por suas próprias escolhas.
A guerra do título se refere ao conflito interno que impede os personagens de tomarem o controle, as travas emocionais, o amadurecimento doloroso, afinal, adaptar-se ao mundo adulto é difícil para o adolescente e, principalmente, para seus pais.
Cotação:
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