Críticas

“Destinos Cruzados”, de Sydney Pollack

Destinos Cruzados (Random Hearts – 1999)

Um desastre de avião deixa viúvos Kay Chandler (Kristin Scott Thomas), congressista de sucesso, e Dutch Van Den Broeck (Harrison Ford), sargento da polícia secreta. Desesperados pelo desgosto e pela procura da verdade, estes dois desconhecidos acabam por se encontrar mais vezes do que o previsto, iniciando a descoberta de estranhas correlações entre os seus cônjuges falecidos.

O saudoso diretor Sydney Pollack marcou seu nome no panteão de Hollywood como sinônimo de competência, sempre são lembrados os maravilhosos “A Noite dos Desesperados”, “Mais Forte Que a Vingança”, “Nosso Amor de Ontem”, “Operação Yakuza”, “Três Dias do Condor”, “Tootsie”, “Entre Dois Amores” e “A Firma”, mas pouca atenção é dada aos seus últimos filmes, algo que considero sintomático de um emburrecimento da sociedade, já que foram lançados em um período da indústria tomado pelo deslumbramento com a computação gráfica.

“A Intérprete” (2005) e “Destinos Cruzados” são material produzido para gente grande. O segundo, principalmente, devido à sua temática, a dificuldade de aceitar e superar a rejeição da pessoa amada.

Um dos méritos da obra é fornecer abrangência psicológica para Harrison Ford poder desenvolver um personagem com camadas, vulnerável, profundamente humano, algo raro em sua carreira. Dutch projeta em sua rotina policial a angústia de ter sido traído pela esposa, a sua agressividade em crescendo, à medida em que vai descobrindo em sua investigação informal a dimensão emocional da entrega dela por aquele estranho.

Ele perde o controle, acaba se colocando em risco, contrastando sobremaneira com a postura de Kay, que, apesar de abalada em sua autoestima, rapidamente se mostra pronta para recomeçar do zero, sinal claro de que vivia um relacionamento de fachada, mantido por pressão da opinião pública, para não existir obstáculos em sua ascensão política.

Um dos toques mais bonitos do roteiro está na cena em que Dutch, desconhecendo a ideologia política de Kay, comparece em seu evento e generosamente doa um valor considerável para sua campanha de reeleição. Esta atitude diz muito sobre o personagem. Ele pode abraçar a autocomiseração ao sentir o perfume daquela que o traiu no quarto secreto, instintivamente erigindo um muro de proteção emocional, mas seu coração reconhece a necessidade do salto de fé.

Há um fator externo que agrega triste beleza à mensagem final, representada na sequência de reencontro no aeroporto, o diretor, seis anos antes, havia perdido seu filho, Steven, num acidente de avião. A ideia de retratar com leveza e tangível esperança o amor improvável entre Dutch e Kay, que nasceu contra todas as probabilidades, utilizando um desastre de avião como ponto de partida, diz muito sobre o estado de espírito do cineasta.

O romance enquanto gênero raramente entrega algo tão refinado, maduro e sincero, que dança num ritmo tranquilo mais comum no cinema europeu, tom captado pela fotografia do francês Philippe Rousselot, complementado pelo tratamento musical jazzístico elegante e minimalista de Dave Grusin.

“Destinos Cruzados” é uma obra que só melhora a cada revisão.

Cotação:

Octavio Caruso

Viva você também este sonho...

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  • Perfeito comentário sobre o filme, ainda mais quando agrega informações sobre a cena no aeroporto. Parabéns. Adoro seus comentários. Sempre tem algo de surpreendente.

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