Críticas

“Trilogia do Inferno”, de Lucio Fulci

Pavor na Cidade dos Zumbis (Paura nella città dei morti viventi – 1980)

Cidade de Dunwich. Uma força maligna é libertada após o suicídio de um padre, que se enforcou no cemitério da igreja.

A fotografia de Sergio Salvati está espetacular neste primeiro filme, potencializando a incrivelmente eficiente atmosfera de pesadelo em cenas como a do padre (Fabrizio Jovine) enforcado, captando bem os contornos paranormais do roteiro, que insere nas convenções do subgênero dos zumbis elementos como sessões espíritas e um livro demoníaco. A trilha sonora de Fabio Frizzi ajuda a tornar memoráveis várias das sequências gore (a cabeça atravessada por uma broca é inesquecível), talvez as mais violentas e criativas da trilogia.

Terror nas Trevas (E tu vivrai nel terrore! L’aldilà – 1981)

Mulher herda um antigo hotel e, enquanto reforma o prédio, abre sem desejar uma das sete portas para o inferno, permitindo assim que os mortos voltem para Terra.

A melhor maneira de enxergar esta obra, inspirada em “A Mansão do Inferno”, de Dario Argento, além de “A Sentinela dos Malditos”, de Michael Winner, realizada com baixo orçamento e filmada em cinco semanas, é como um perturbador pesadelo. Um dos MELHORES filmes de terror de todos os tempos.

A trama é simples: um hotel é construído sobre um dos sete portões do inferno, algo que a nova proprietária, vivida pela inglesa Catriona MacColl, acaba descobrindo ao entender que um velho bruxo havia sido assassinado décadas antes, crucificado em uma das paredes do local. O roteiro é uma desculpa para o diretor exercitar sua macabra criatividade, elaborando cenas sangrentas surrealistas, como o ataque de aranhas em uma biblioteca, o rosto de uma mulher sendo derretido lentamente pelo ácido, ou o devastador terceiro ato passado teoricamente no hospital, com o herói portando um revólver de munição infinita.

A realidade que poucos críticos percebem é que o casal jamais deixou o hotel. Os últimos vinte minutos são a forma encontrada por Fulci para retratar o além (l’aldilá). O casal tenta fugir adentrando um elevador, apenas para descobrirmos que eles acabaram voltando para o mesmo ambiente, a sala de autópsia. O que pode ser tido como um erro de continuidade, eu prefiro entender como mais uma maneira de confundir o público, deixando claro que naquele pesadelo, tempo e espaço são conceitos indomáveis. O homem percebe que seu revólver ficou sem munição, porém, exatamente como num sonho, ele segue atirando.

Os personagens descobriram mais do que deviam, sendo penalizados com a descida ao inferno, culminando com a exposição da cegueira. Eles já estavam nas trevas durante todo o terceiro ato, fazendo-nos entender o tipo de existência maldita que Emily, presa na escuridão desde o incidente no passado, e a jovem ruiva enfrentavam. Os terrores vividos por eles, profetizados no livro de Eibon, dão vazão à obsessão do diretor com os olhos, um gore impactante, mérito do mestre Giannetto De Rossi, e que nos remete a Luis Buñuel e seu “Um Cão Andaluz”. O final melancólico, abrupto, difícil de esquecer, estabelece o terror do casal como uma realidade que está apenas começando.

Priorizando a atmosfera, lição que os cineastas modernos do gênero falham em entender, Fulci desorienta constantemente o espectador, utilizando a carnificina, focando na desintegração da carne, como uma maneira metafórica e espiritualista de filosofar sobre a fragilidade do corpo. O deserto que descobrimos ao final, um horizonte sem fim de desesperança, uma visão depressiva do além.

A Casa do Cemitério (Quella Villa Accanto al Cimitero – 1981)

Norman Boyle muda-se com a família para uma velha mansão ao lado de um cemitério. E violentas mortes começam a acontecer.

Neste último filme da trilogia, Fulci subverte algumas ideias já estabelecidas. Ao contrário dos filmes anteriores, desta vez não há um livro mágico, nem mesmo há um portal.

O roteiro, o mais problemático da trilogia, dá espaço para fantásticas cenas de morte, aquele gore competente e criativo usual nos trabalhos do diretor, mérito de Giannetto De Rossi, mas a estrutura dessa vez remete mais aos filmes de fantasmas, deixando para o excelente terceiro ato a resolução do mistério que envolve os estranhos barulhos escutados no sótão da nova casa da família Boyle. Vale destacar a ótima trilha sonora de Walter Rizzati.

É curioso perceber que a citação que encerra a trama, informada como sendo do escritor Henry James, do clássico “A Volta do Parafuso”, na realidade, foi criação do próprio diretor.

Octavio Caruso

Viva você também este sonho...

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