Star Wars – A Ascensão Skywalker (Star Wars: The Rise of Skywalker – 2019)
Uma breve análise do contexto em que o projeto se enquadra, para aqueles que não acompanham as notícias do universo geek. A “Trilogia Disney”, como está sendo chamada pelos fãs, veio para muitos morderem a língua com relação às críticas que massacravam as prequels dirigidas por George Lucas.
Aqueles roteiros tinham muitos problemas, mas eram pensados por um apaixonado pelo material, ninguém menos que o criador da saga, eles ofereciam algo novo dentro do cânone, havia um conceito claro do todo, cada episódio tinha tom próprio, mas havia senso de unidade temática, reverenciando os clássicos, inserindo rimas visuais, mas nunca repetindo gratuitamente a estrutura das tramas. Boa parte do público, como todo ser humano, desejava mais do mesmo, a repetição é mais popular, comercialmente mais atraente, o risco da reação ao novo é o pesadelo que perturba os executivos, especialmente em produções com orçamentos vultuosos.
Lucas foi apedrejado, o tempo passou, os filmes seguem encantadores em revisão, mas o sonho do rapaz de outrora agora havia sido comprado pela Disney, administrado por Kathleen Kennedy, que se dedicou em duas frentes básicas: avançar a nada sutil agenda progressista e eliminar a relevância da família Skywalker, já que nesta nova realidade, a Força pode se manifestar em qualquer indivíduo na galáxia. Você pode estar pensando: Eliminar? Como assim? O título é “A Ascensão Skywalker”. Creia-me, ao final da sessão, você vai entender meu ponto.
Analisando como fã que cresceu apaixonado pelos clássicos, fica difícil se satisfazer com o emburrecimento narrativo que já se mostrava latente em “O Despertar da Força”, uma cópia barata, passo a passo, da estrutura do original de 1977, com a adição de personagens fracos e, pior, com personalidades rasas. Rey, Finn, Poe, Kylo, quem são? O que comem? Como vivem? Três filmes inteiros e o desenvolvimento é praticamente ZERO.
Se você pretende fazer um forte exercício de imaginação e verdadeiramente se importar com eles, precisa ler os quadrinhos e livros complementares. Isto é falha básica e indesculpável de roteiro, pergunte a qualquer fã quem é Han Solo, Leia ou Luke, ele vai te passar uma ficha técnica extensa, com traços de comportamento, senso de humor, motivações claras, não são apenas action figures defendendo poses heroicas em cartazes coloridos.
E, após ver o desfecho desta trilogia, posso afirmar sem receio algum que não houve nem a tentativa de estabelecer previamente um plano do que pretendiam abordar, erro empresarial crasso, vários elementos são prejudicados por terem sido inventados e enxertados no capítulo que deveria resolver os conflitos, não apresentar um mundo de novas possibilidades, desperdiçando tempo em rostos novos com personalidades ainda mais rasas, confundindo o público com um ritmo frenético. Pontos fundamentais para o entendimento de reviravoltas na trama, coisas que deveriam ter sido introduzidas mesmo que timidamente nos anteriores, para que fizessem algum sentido, simplesmente são apresentadas em diálogos expositivos problemáticos.
Abrams e seu corroteirista Chris Terrio tentam desesperadamente refutar tudo o que Rian Johnson bolou no anterior, “Os Últimos Jedi”, quebrando a consistência após a opção controversa do colega que quis desconstruir os mitos, debochar das expectativas e, por conseguinte, acabou dando uma banana na direção dos fãs antigos. A mensagem é transmitida de forma bastante objetiva, o fan service é utilizado sem moderação, por vezes preguiçosamente, tendo como base desta vez o esqueleto de “O Retorno de Jedi”.
A realidade é uma só, os rumores de bastidores sinalizando que até três cortes radicalmente diferentes do filme foram preparados, após reações muito negativas com plateias-teste, resultando em uma versão final que parece uma colcha de retalhos, além da baixíssima procura por ingressos na pré-venda neste capítulo final provam que a estratégia da Disney foi muito equivocada em seu cerne. Os filmes não se “conversam” (em estilo e execução), a experiência de ver a nova trilogia é esquizofrênica.
A garotada de hoje não se importa com estes novos personagens ocos, há muitas opções de entretenimento, qualquer mínimo interesse despertado na franquia é mérito dos antigos fãs, que, apesar de contrariados com os rumos da história (o quarteto principal clássico sequer é visto dividindo a mesma cena, nem mesmo em flashbacks, lastimável, uma chance de ouro perdida para sempre), ainda estão curiosos com a despedida oficial daqueles heróis, ainda que eles sejam tratados como pontas de luxo, reapresentados “desidratados” e, por vezes, completamente incoerentes com suas versões anteriores.
Só que não posso pensar apenas como fã, preciso respeitar meu público e minha função enquanto crítico profissional. Não se analisa uma obra por aquilo que ela poderia ser, mas por aquilo que ela é, levando em consideração o esforço criativo da equipe e a proposta do realizador. Dito isto, como se encaixa qualitativamente “A Ascensão Skywalker” nesta nova trilogia e, por ser também o desfecho da saga, como ela se coloca diante de seus predecessores?
O primeiro ato é caótico no pior sentido, mas, exatamente devido ao desespero latente dos envolvidos com a produção, há uma clara atitude de controlar os danos, um interesse genuíno em agradar o público, o fan service é a engrenagem desta máquina. Se os dois anteriores tratavam com ar blasé os elementos nostálgicos, Abrams desta vez busca com todas as forças resgatar o clima dos filmes clássicos. Ele dá um abraço apertado na breguice folhetinesca, ponto positivo. Por falar nisto, vale destacar que Lando (Billy Dee Williams) retorna e não faz feio, a sua participação é pequena, mas tratada com o merecido respeito. A participação de Carrie Fischer, falecida antes do início das filmagens, resgata trechos não utilizados de sua participação em “O Despertar da Força”, um recurso executado com competência e sensibilidade, garantindo um desfecho bonito para a personagem.
A trama pode não fazer sentido em muitos momentos, pode até trabalhar emocionalmente contra os eventos estabelecidos no cânone, mas é inegável que, pela primeira vez desde que a Disney tomou o controle da saga (excluindo o ótimo spin-off “Rogue One”), estamos diante de algo que parece mesmo “Star Wars”. O relacionamento entre os heróis soa orgânico, com senso de humor eficiente, potencializado pela presença marcante de C3PO (Anthony Daniels) na aventura. Até a tira de cartolina Poe Dameron (Oscar Isaac), outrora reduzida apenas à imagem do piloto infalível, ganha contornos espirituosos, uma vivência como contrabandista e um interesse romântico, óbvia tentativa de reforçar seu posto como um Han Solo 2.0.
Apesar de ser problemático em vários sentidos, “A Ascensão Skywalker” é puro coração, analisado estritamente como obra individual, levando em conta aspectos técnicos de roteiro, pode ser facilmente colocado entre os piores da nonalogia, mas ele acerta no essencial.
Cotação:
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Concordo com tudo que disse.
Muita coisa ali não faz sentido, fruto de uma falta de planejamento inacreditável.
Deveriam aprender com a Marvel, que criou uma linha narrativa até o capítulo derradeiro.
Não por acaso, contrataram Kevin Feige pra novas aventuras.
A pergunta que fica é: sem a família Skywalker, haverá interesse?
Na minha visão, basta criar personagens consistentes e carismáticos.
Qualquer filme se sustenta com isso, se bem construído.
Abraços!
Grato pela gentil atenção com o texto, Alexandre.
Abração!