Críticas

“Star Wars: Episódio I – A Ameaça Fantasma”, de George Lucas

Star Wars: Episódio I – A Ameaça Fantasma (Star Wars: Episode I – The Phantom Menace – 1999)

Obi-Wan (Ewan McGregor) e seu mentor, Qui-Gon (Liam Neeson), embarcam em uma perigosa aventura na tentativa de salvar o planeta das garras de Darth Sidious (Ian McDiarmid) e seu pupilo, Darth Maul (Ray Park). Durante a viagem, eles conhecem um habilidoso menino, Anakin Skywalker (Jake Lloyd), e decidem treiná-lo para se tornar um Jedi. Mas o tempo irá revelar que as coisas nem sempre são o que aparentam ser.

Contextualizando o fenômeno em minha vida.

Eu vivi intensamente o lançamento deste filme, tinha 15 anos de idade, já apaixonado pela trilogia clássica que revia com frequência em VHS, uma linda edição que ganhei de presente do meu pai, adquirida na locadora “RG Vídeo”, do amigo Ricardo, com os títulos envernizados em vermelho nas capas. A internet discada dava seus primeiros passos desajeitados no país, fazíamos curso formal de “introdução à informática”, entrávamos online apenas de madrugada, um vídeo curto demorava um dia inteiro para ser baixado, logo, aguardei ansiosamente para ver o tão comentado “teaser trailer“.

Na época, as informações sobre cinema saíam mensalmente nas revistas especializadas, folheávamos milhões de vezes até memorizar o conteúdo, gravávamos as imagens nas retinas, absorvíamos cada precioso detalhe. As capas temáticas da revista “Sci-Fi News” penduradas na banca de jornal emocionavam o fã, a experiência sensorial era rica, inesquecível. Ao clicar no “play”, a mão chegava a tremer, a magia do ritual se prolongava nas discussões sobre o material entre os amigos nerds da escola. Não fiz isto, mas conheci pessoas que pagavam a sessão de um filme qualquer na sala escura só para ver o trailer oficial na tela grande, depois levantavam e deixavam a sala com a sensação de dever cumprido.

Claro que prestigiei a obra no dia da estreia, lembro que gostei do que vi, com algumas ressalvas, vibrei com a homenagem à corrida de quadrigas de “Ben-Hur”, meu filme favorito, amei o confronto final dos Jedi com Darth Maul, mas compartilhei o incômodo de muitos com o excesso de alívio cômico na figura de Jar Jar Binks. Tive na coleção em VHS, depois adquiri a versão em DVD, com o documentário mais completo que já vi sobre todos os passos de uma produção, um trabalho de amor mesmo. Hoje, tenho a saga em Blu-ray, mas também está disponível em questão de segundos nas plataformas de streaming.

É tudo tão rápido, não há mais dificuldade, não há mais magia. Na solidão da minha memória, revivo aqueles dias agradáveis, esqueço os problemas, sinto a lágrima descer no rosto. Ah, como eu amo o cinema.

Análise após revisão recente…

Após a Disney comprar a franquia e tolamente reduzir a criação de George Lucas à rasteiro panfleto da agenda política progressista globalista, produzindo uma trilogia que varia de qualidade entre o detestável e o medíocre, considero válido que “A Ameaça Fantasma” seja reavaliado por seus méritos. O roteiro entregou um novo mundo de possibilidades, expandindo a mitologia, entre erros e acertos, pelo menos tentou apresentar algo inédito, sem se debruçar nos moldes dos originais, inserindo personagens tridimensionais e com arcos narrativos perceptíveis.

Só nos primeiros trinta minutos, já somos conduzidos por cenários intensamente criativos, espaço sideral, novos planetas, novas raças alienígenas e uma civilização no fundo do oceano. A reclamação à época era o foco em elementos como taxações de rotas de comércio, discursos no senado, muito papo burocrático, mas este foi exatamente o trunfo do projeto, Lucas desenhou uma história em três atos, tudo o que é estabelecido no primeiro, reforça o impacto emocional do desenvolvimento da trama no último, exemplo de inteligência empresarial e integridade artística, uma aula que a Disney infelizmente cabulou.

Qui-Gon Jinn (Neeson) é um Jedi rebelde, que não teme desafiar as decisões de seus superiores por aquilo que acredita, o treinamento do pequeno escravo responsável por salvar a causa, que toma o lugar de seu aprendiz, Obi-Wan Kenobi (McGregor). A câmera não se furta de mostrar nos olhos do jovem o natural ciúme, inserindo na figura imortalizada por Alec Guinness, símbolo de nobreza, traços enriquecedores de uma personalidade conflituosa.

A saga é primordialmente direcionada ao público infantojuvenil, logo, a única criança na trama, Skywalker, recebe tratamento especial, ganhando destaque, ainda que pouco crível, até mesmo na batalha final espacial em larga escala, outro ponto que foi criticado à época, mas que é puramente compreensível, já que ele representa o escapismo lúdico da meninada, assim como o adolescente Luke, no original de 1977, representava os anseios da juventude, explorar o mundo sem a patrulha parental.

O mistério fascinante por trás do vilão Darth Maul (Park), uma inegável ameaça física, cumpriu a difícil tarefa de entregar uma imagem tão poderosa quanto a do icônico Darth Vader. A coreografia acrobática do embate final jamais foi superada, transmite fúria, propósito tangível, o choque entre estilos diferentes, a ferocidade animalesca de Maul contra a serenidade samuraica de Qui-Gon e a intempestividade ainda não plenamente lapidada de Obi-Wan. O resultado é, ainda hoje, empolgante, injetando adrenalina no aspecto mais lembrado dos originais, garantindo a apreciação de uma nova geração.

A ameaça fantasma, a ascensão gradativa do aparentemente inofensivo Palpatine (McDiarmid) ao poder ditatorial, engrandece a visão mercadologicamente corajosa de Lucas. Todos esperavam uma bobagem barulhenta aos moldes do que lotava as prateleiras da Blockbuster, mas o idealizador preferiu tomar tempo generoso na história plantando as sementes da criação do maléfico império galáctico.

Analisando em retrospecto, a trilogia prequel é claramente um trabalho de amor, merece ser lembrada com mais carinho.

Cotação:

Trilha sonora composta por John Williams:

Octavio Caruso

Viva você também este sonho...

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