Críticas

Sétima Arte em Cenas – “Milagre em Milão”, de Vittorio De Sica

Milagre em Milão (Miracolo a Milano – 1951)

Uma mulher acha um bebê abandonado num jardim. Aos 18 anos, Totó (Francesco Golisano) vai para Milão. Na cidade grande, mora num terreno ocupado por moradores pobres, mudando a vida de todos com sua bondade. Após descobrirem petróleo, a felicidade dos moradores é ameaçada pelo proprietário, que manda a polícia evacuar o local. Quando tudo parece perdido, Totó recebe um presente dos céus, começando a fazer muitos milagres.

Vittorio De Sica, logo após o realismo de “Ladrões de Bicicleta” emocionar o mundo, entregou esta linda fábula (que inicia com o tradicional “Era uma vez…”) que transborda leveza e encanto, provando ser possível retratar a trágica existência da sociedade italiana no pós-guerra de forma poética, lúdica, e, principalmente, esperançosa, com a inocência gentil do protagonista chapliniano servindo como exemplo inspirador de integridade.

Muitos colegas críticos apedrejaram a obra por considerá-la rasa, a usual ignorância dos pseudointelectuais inseguros e invejosos, incapazes de entender que a mensagem transmitida pelo realismo mágico trabalhado por De Sica atingiu emocionalmente mais pessoas no mundo, ao contrário das fitas politizadas umbilicais, ásperas, cínicas e arrastadas, que induzem ao sono o público mirrado até hoje.

Uma das cenas mais bonitas do cinema da década de 50 ocorre no onírico “segundo tempo”, o grupo de moradores do bairro pobre, ao final, libertado milagrosamente do destino cruel, atravessando o céu em suas vassouras, cantando alegremente: “Tudo o que precisamos é de um barraco, para viver e dormir. Tudo o que pedimos é um par de sapatos, umas meias e um pouco de pão. É tudo o que precisamos para crer no amanhã”.

O diretor propõe uma corajosa autocrítica ao vitimismo (talvez o ponto que incomoda os detratores), inclusive estético, do neorrealismo italiano, algo que contaminou várias indústrias, até mesmo a brasileira, com a patética “estética da fome” defendida pelo patrono da chatice, Glauber Rocha.

Utilizando trucagens visuais eficientes à época, o genial De Sica mostrou que pode extrair beleza da dor, extrair otimismo da situação mais terrível, em suma, que o caminho para um mundo mais humano e justo é pavimentado pelo amor, nunca pelo ressentimento.

“Milagre em Milão” sobreviveu muito bem ao teste do tempo e pode ser encontrado facilmente garimpando pela internet.

Octavio Caruso

Viva você também este sonho...

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  • Uauuuu! Gosto de filme assim. Assiti Ladroes de Bicicleta e nunca vi filme mais triste (tirando Duas Mulheres e O Homem Elefante). Vou procurar esse que parece ser um puco mais ameno! Abraços!

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