Críticas

“Os Monkees Estão de Volta”, de Bob Rafelson

Os Monkees Estão de Volta (Head – 1968)

As aventuras dos Monkees em viagem psicodélica através de uma série de paródias de todos os gêneros de filmes importantes, incluindo os ocidentais, os musicais e os filmes de guerra.

Eu amava ver os episódios da série “Os Monkees” na infância, passavam em horário nobre na TV Educativa, já era fascinado pela cultura popular da década de 60, escutava os discos, mas nada me preparou para a sessão de “Head” na adolescência. Não me recordo se vi em VHS alugado ou em exibição televisiva, mas me recordo bem da estranheza que senti, não era somente nonsense, parecia por vezes uma tentativa direta de escárnio com a própria banda.

As informações eram escassas naquela época, não encontrei nada nas revistas de cinema, logo, a imaginação voava livremente, criávamos teorias bizarras sobre os bastidores. Anos depois, revendo com um olhar mais apurado, entendi o brilhantismo e a coragem do produto.

O grupo musical era, por si só, uma farsa montada por executivos, surfando na onda de sucesso dos Beatles, as suas personas e até mesmo os figurinos foram friamente pensados, não muito diferente do que acabou se tornando a indústria musical moderna. O carisma dos rapazes, facilitado pela exibição frequente na TV, atraiu o público jovem, eles se tornaram um fenômeno de apelo mundial, mas durante muitos anos sofreram com o preconceito daqueles que os viam como uma variação musical da luta livre teatralizada.

Reportagens sensacionalistas afirmavam que eles nem sabiam tocar seus instrumentos, mentira que a banda conseguiu reverter quando começou a se apresentar em shows. Micky Dolenz e Michael Nesmith, os integrantes vivos, seguem se apresentando nos palcos, encantando fãs de todas as idades.

Nos primeiros dez minutos, uma canção resume a proposta: “Nós somos os Monkees, você sabe que amamos agradar, nossa imagem fabricada sem qualquer conteúdo… Você diz que gosta de ação, dança, então vamos te entregar, sabemos que não se importa, nós nunca seremos livres”.

O roteiro, escrito por Jack Nicholson e pelo diretor Bob Rafelson, então nos conduz por esquetes surreais, ao estilo do grupo inglês Monty Python, inserindo críticas ácidas ao tratamento da guerra pela imprensa, alternando registros da banda no palco com cenas reais (e bastante violentas) da tragédia humana, opção extremamente bizarra.

O clima da produção foi exótico, a equipe toda estava tomando psicotrópicos pensando que eram jujubas, basta constatar que Mireille Machu, a bela garota que beija calorosamente na boca os quatro rapazes na cena introdutória, logo após Micky ser salvo pelas sereias, era a namorada de Nicholson na época da filmagem.

É simbólico também o momento em que o mesmo Micky interrompe a gravação de um faroeste, dirigindo-se ao próprio diretor pelo nome, reclamando estar cansado daquela falsidade toda, ato que culmina na fuga dele rasgando o fundo pintado do cenário. Logo depois, vemos a angústia de Davy Jones entre abraçar o pugilismo ou seguir tocando violino, cena afinada no diapasão dramático cafona, com direito à um dedo de alguém da produção ajeitando a lágrima artificial no rosto de sua amada, vivida por Annette Funicello. A desconstrução é a tônica da produção.

Há momentos impagáveis, como quando o grupo se transforma em caspas na cabeleira de Victor Mature, mas gosto bastante da simpática sequência musical que homenageia o tradicional teatro Vaudeville, ao som de “Daddy’s Song”, composta pelo grande Harry Nilsson, que conta com uma espetacular coreografia de dança, defendida por Davy Jones e Toni Basil, aquela que estourou nos anos 80 com o hit “Mickey”. A cena ganha contornos psicologicamente densos na segunda parte, com a letra abordando abandono parental, mas o que impressiona é o contraste visual proporcionado pela montagem.

Os fãs obviamente odiaram a obra em sua estreia, os críticos desprezaram, os próprios Monkees concordam que foi um passo mercadologicamente insano, mas o tempo foi generoso com “Head”, a experiência é fascinante, criativamente instigante, apesar de não fazer sentido algum.

Se você leu o texto e não se interessou minimamente em conhecer esta pérola, talvez esteja sóbrio demais.

Octavio Caruso

Viva você também este sonho...

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  • Eu via o seriado na TV quando era criança; não entendia muito bem; depois fui conhecer o surrealismo. Eles imitavam os Beatles e alguns episódios eram engraçados.

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