Perversa Paixão (Play Misty for Me – 1971)
O DJ Dave (Clint Eastwood) trabalha numa rádio e fica curioso para conhecer uma sensual ouvinte (Jessica Walter) que liga várias vezes pedindo a canção “Misty”. Os dois se conhecem, mas Dave decide não levar o caso adiante. Ela não se conforma e passa a persegui-lo.
O jovem Clint Eastwood sonhava em se tornar um diretor e, sendo um indivíduo íntegro e de personalidade firme, só conseguia enxergar este passo acontecendo na carreira com total liberdade criativa. Ele confidenciava suas ideias para o amigo Irving Leonard, cofundador da produtora Malpaso, levantada anos antes com o lucro obtido como ator na Trilogia dos Dólares, de Sergio Leone.
Leonard faleceu em 1969, a empresa já tinha conquistado bons frutos com pérolas como “A Marca da Forca”, “Meu Nome é Coogan” e “Os Abutres Têm Fome”, logo, Clint decidiu arriscar tudo (inclusive como ator, saindo de sua zona de conforto como homem de ação) e finalmente dirigir seu primeiro projeto, com o apoio daquele que sempre acreditou em seu talento, Don Siegel, “Perversa Paixão”, um thriller psicológico arrepiante, roteirizado por Jo Heims e Dean Riesner, com a fotografia sempre elegante de Bruce Surtees. Vale destacar também na trilha sonora a belíssima “The First Time Ever I Saw Your Face“, cantada por Roberta Flack, canção que se tornou um hit internacional (Elvis Presley lançaria sua versão no ano seguinte) graças ao sucesso do filme.
É impressionante como Clint demonstra tremenda segurança já nesta estreia, controle total na construção de suspense, sem gordura extra, sem firulas estéticas, estabelecendo o clima tenso sem necessidade de reviravoltas ou surpresas, recurso usual no gênero, ele consegue manter o público preso à trama apenas evidenciando que a perigosa ouvinte, vivida com brilhantismo por Jessica Walter, é capaz de tudo, potencializando a expectativa até mesmo nas sequências aparentemente inofensivas, insinuando que o mal opera nas sombras. Quando a história se encaminha para situações verdadeiramente apavorantes nos últimos 20 minutos, o investimento emocional conquistado é recompensado sensorialmente.
Outros projetos apostaram em premissas semelhantes nas décadas seguintes, como “Atração Fatal”, com Glenn Close, e “Louca Obsessão”, com Kathy Bates, mas esta pérola acabou sendo esquecida nas prateleiras empoeiradas do tempo, injustiça que pretendo desfazer com este texto.
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