Críticas

Análise (com SPOILERS) do “ELVIS”, de Baz Luhrmann

Eu publiquei minha crítica recentemente, mas, como fã, acho válido expandir a análise, incluindo detalhes da trama.

LEIA A MINHA CRÍTICA COMPLETA CLICANDO AQUI.

No momento mais patético e infantilizado da indústria norte-americana, prestigiar uma obra de um artista autoral com firmeza na assinatura é, por si só, uma bênção, logo, o estilo de Baz Luhrmann, além de captar brilhantemente a essência da teatralidade na parceria entre Tom Parker (Tom Hanks) e Elvis Presley (Austin Butler), também garante uma experiência sensorial arrepiante, cinema para ser apreciado na melhor sala, com som alto, na maior tela, um espetáculo que faz rir e chorar, um trabalho que honra o inestimável legado do homenageado.

Alguns pontos que me incomodaram nas críticas negativas que li dos colegas:

  • O roteiro toma muitas liberdades criativas.

Qualquer pessoa que entenda um pouco sobre roteiro, sabe que o primeiro aspecto que se deve levar em consideração como critério na análise é A PROPOSTA da obra.

Nos primeiros minutos, “ELVIS” já estabelece que seu narrador não é confiável, afinal, estamos enxergando a sua vida através dos olhos de seu moribundo empresário, um patife, um trapaceiro. Partindo deste ponto, não é estranho que a trama não se aprofunde na vida pessoal do cantor, o elemento crucial é a criação do mito, aquilo que importava para Tom Parker, a transformação do jovem tímido e pobre de Tupelo no astro internacional, evidenciando, claro, a importância do empresário nesta equação, perceba como no descer das cortinas do show em Las Vegas, Parker é mostrado sutilmente agradecendo os aplausos da plateia. Como não aplaudir a decisão estética de abordar a paixão do menino Elvis pelo herói Capitão Marvel Jr. em um segmento que remete à linguagem das revistas em quadrinhos?

“ELVIS” não é um documentário, ele não precisa ser cronologicamente correto, principalmente quando deixa claro logo no início que é afinado no diapasão de fábula, ele é conduzido imageticamente, detalhes como as jumpsuits utilizadas nas turnês erradas, ou as canções selecionadas para emoldurar as cenas, algo que os fãs dedicados vão perceber (por exemplo: “Trouble” só entraria na vida de Elvis como parte da trilha sonora de “Balada Sangrenta”, em 1958, no filme, a canção, devido à forte simbologia da letra, inteligentemente é reposicionada para 1956, no show em Russwood Park), servem apenas à narrativa, e, vale salientar, cumprem com louvor esta função.

  • O roteiro força a mão na tentativa de mostrar Elvis como um homem bom.

Eu encontrei este argumento em alguns textos, creio que fala mais sobre o caráter torto de quem escreve, talvez a pessoa, por militância política, tenha se incomodado com a celebração de um artista CRISTÃO e de DIREITA, provavelmente desejava o viés dos canalhas influencers de youtube que monetizam afirmando que ele era racista e que se apropriou da cultura negra, uma bobagem que todo estudioso da história da música já destruiu.

Como fã, acho até que o roteiro poderia ter mostrado MAIS o lado generoso do Elvis, por exemplo, o seu hábito de presentear estranhos humildes nas ruas com carros e até casas, algo que nem foi citado no filme, ou o seu gesto grandioso no momento mais difícil da carreira do amigo Jackie Wilson, cantor negro famoso por pérolas como “Lonely Teardrops” e “Higher and Higher”, que viu sua carreira acabar quando entrou em estado de coma após um ataque cardíaco no palco, algo que abalou Elvis, que, sem pensar duas vezes, pagou todas as contas hospitalares do amigo por anos, atitude que manteve em segredo na época.

O filme não precisava se esforçar neste sentido, Elvis era incrivelmente talentoso e, acima de tudo, um ótimo caráter.

É genial a forma como o roteiro resgatou a obscura canção “Cotton Candy Land”, que fazia parte da trilha sonora de “Loiras, Morenas e Ruivas” (1963), ressignificando ela como recorrente leitmotiv sonoro da manipulação psicológica do empresário. A escolha evidencia o estudo do diretor na fonte, elemento perceptível em todos os aspectos da produção. Outra ótima opção neste sentido foi utilizar a letra de “Suspicious Minds” como alegoria direta para a armadilha do empresário no contrato com o International Hotel.

Uma cena que reflete bem a questão da liberdade criativa é aquela em que Elvis, do palco, esbravejando, demite seu empresário. Na realidade, ele JAMAIS seria grosseiro na frente do público, ele, mesmo doente, entregava o melhor em seus shows, há casos registrados em que ele, sem condições de se manter de pé, mesmo assim, fazia questão de repetir o desfecho da canção que não havia finalizado bem. O caso mostrado no filme é real, mas aconteceu nos bastidores, porém, inteligentemente, o roteiro insere como reforço dramático necessário na transição para o devastador terceiro ato.

A opção de simbolizar a despedida do cantor com a linda “Unchained Melody” é emocionalmente impactante, a canção, que ele frequentemente defendia no período, sempre ao piano, representava claramente um pedido de ajuda, um testamento em vida, prestando reverência ao público que nunca o abandonou, Elvis realmente acreditava que seria esquecido, que sua contribuição para a música era medíocre, a imprensa sensacionalista atacava duramente, cruelmente, seu ganho de peso, os jornalistas desprezavam seus esforços, os mesmos que, assim que ele faleceu, escreveram várias homenagens.

“ELVIS” só melhora a cada revisão, que os pais apresentem a obra aos seus filhos, esta geração tão carente culturalmente, que o eterno Rei do Rock siga vivo, principalmente hoje em dia, nestes tempos sombrios, ele é mais necessário do que nunca!

Octavio Caruso

Viva você também este sonho...

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