Elvis (2022)
Desde sua ascensão ao estrelato, o ícone do rock Elvis Presley (Austin Butler) mantém um relacionamento complicado com seu enigmático empresário, Tom Parker (Tom Hanks), por mais de 20 anos.
A minha relação com a obra de Elvis Presley é intensa desde pré-adolescente, eu era extremamente introvertido, ele me ajudou a fortalecer minha autoestima durante a fase de bullying escolar, ganhei confiança para soltar a minha voz em todos os sentidos, inclusive cantando. Anos atrás, já estabelecido profissionalmente como crítico de cinema, ator, escritor e cineasta independente, fui o curador da mostra “Elvis é Joia”, no Cine Joia (Copacabana – RJ), cinco noites mágicas em que apresentei filmes de sua fase hollywoodiana e, antes de cada exibição, cantei pérolas de seu repertório.
Na realidade, sendo um estudioso da carreira dele, sei do potencial cinematográfico de sua vida, mas, por algum motivo, todas as tentativas neste sentido naufragavam, vários telefilmes fracos, projetos equivocados. O caso é que, em 2001, quando eu assisti ao “Moulin Rouge”, de Baz Luhrmann, fiquei apaixonado pelo filme e pensei que este diretor seria perfeito para a tarefa, já que ele entenderia bem o aspecto da teatralidade, algo essencial na jornada do cantor, um elemento fundamental para se compreender a sua história. E, sim, após a sessão, afirmo que a escolha não poderia ter sido melhor.
O conceito do argumento de Jeremy Doner e do próprio diretor é brilhante, tratar o roteiro, assinado por Sam Bromell, Craig Pearce, Doner e Luhrmann, como um espetáculo fiel ao espírito das apresentações do próprio Elvis na década de 70, enxergando o homem pelos olhos de seu empresário, o gênio diabólico Tom Parker, proposta que faz com que a trama, em suas engrenagens, seja coerente ao background profissional circense do narrador e também respeite a forma como o próprio homenageado lidava com sua imagem pública.
Ao apresentar Elvis com “Also Sprach Zarathustra”, além de enfatizar o amor do Rei do Rock pelo cinema, ponto que poucos discutem, e que tive o prazer de abordar em minha entrevista exclusiva com a sua companheira nos anos finais, Ginger Alden, Luhrmann injeta a catarse emotiva que o artista criava em seus shows, a arrepiante antecipação que conduzia à sua entrada triunfante no palco.
No momento em que Austin Butler defende a grandiosa “An American Trilogy”, ainda nos primeiros minutos, impecavelmente dominando os maneirismos do astro, o público já é fisgado, e, principalmente, entende que aquela não é uma cinebiografia normal, tradicional, mas sim, uma carta de amor de um fã para fãs do mundo todo.
A opção mais fácil e preguiçosa seria selecionar um recorte temporal e explorar dramaticamente ao máximo, felizmente a obra aceita o desafio de sintetizar os 42 anos de vida do cantor em quase 3 horas, que, vale salientar, passam voando, da infância pobre do menino que buscava o escapismo das revistas em quadrinhos e conseguia vencer a timidez nos cultos religiosos, atravessando pela década em que se tornou pai e viveu o sonho hollywoodiano, o retorno glorioso às raízes em 1968 e a empolgante reinvenção musical em Las Vegas, até o melancólico final.
O primeiro ato transmite em seu ritmo frenético o impacto da música e da dança de Elvis na sociedade da época, escolha sensorial que o diretor domina com folga, algo que nunca soa gratuito. A edição vai se tornando menos extravagante na medida em que sentimos o amadurecimento do protagonista, refletindo a sua mudança de atitude, tomando as rédeas e correndo riscos.
As nuances sobre a convocação para o exército e, por conseguinte, o sentimento de culpa no jovem pelo falecimento da querida mãe (Helen Thomson), as fragilidades do simplório pai (Richard Roxburgh), a crescente manipulação psicológica do empresário, o amor por Priscilla (Olivia DeJonge), tudo avança a narrativa, que adota a necessária liberdade poética com extrema sensibilidade, priorizando a imersão emocional na construção do mito.
A reconstituição de época na direção de arte é impecável, especialmente nos segmentos focados no especial televisivo de 1968 e na estreia no International Hotel, momentos em que o roteiro evidencia o brilhantismo de Elvis nos bastidores, como quando rege informalmente a banda e a orquestra, buscando uma identidade sonora única, transferindo a sua pegada animalesca, desafiadora, instintiva, para os músicos, culminando na química perfeita que encantava as plateias.
Ele cantava com a alma e se movimentava naturalmente, não havia coreografia, a sua arte era corajosa, a sua presença era imponente, mas a sua essência era ingênua, a trama trabalha bem o contraste entre estas características e o fingimento constante de Parker, um experiente trapaceiro, o típico parasita que se agarra no carisma alheio e só larga quando o hospedeiro desaba sem vida.
O desfecho é devastador, muito emocionante, mérito da entrega pungente de Austin Butler, a dor em seus olhos é tocante, a sua interpretação em todos os estágios da jornada do astro merece ser aplaudida de pé.
“ELVIS” é a cinebiografia que o artista merecia, desde já, um dos melhores filmes do ano.
Cotação:
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Eu pude sentir o amor e dedicação da equipe na construção do filme. Não sei utilizar os termos técnicos, mas sei dizer o que senti. Em vários momentos eu esqueci que Elvis tinha morrido. Saí cheia de orgulho pela linda homenagem merecida ao nosso querido Elvis.