Críticas

Crítica nostálgica da telenovela mexicana “Carrossel” (1989-1990)

Carrossel (Carrusel – 1989-1990)

Helena (Gabriela Rivero) é uma professora que cuida dos pequenos alunos do segundo ano da Escola Mundial. Com seu amor, carinho e paciência, ela vai ajudar estas crianças a lidar com seus dramas familiares e a entender os prós e os contras da vida com muita alegria e brincadeira.

É curioso, recebo com frequência pedidos de leitores para que eu escreva também sobre telenovelas, mas não gosto do formato, considero que, na melhor das hipóteses, sendo obras abertas que se moldam em tempo real à apreciação do público, por lógica artística, não conseguem ser mais do que raso entretenimento com prazo de validade curto.

Eu acompanhei apenas duas novelas na vida, na época da infância, a brasileira “Vamp”, pela sua temática, e a mexicana “Carrossel”. A primeira, quando analisada hoje, constrange mais do que diverte, uma bobagem, já a segunda, dirigida por Albino Corrales e Pedro Damián, produzida pela Televisa e exibida no Brasil pela primeira vez em 1991, ainda mantém sua essência intacta, segue terna, doce, com um texto calcado em valores éticos fundamentais, um material extremamente sensível que emociona adultos e crianças. Há, logo, um propósito importante para que eu resgate esta pérola das estantes empoeiradas do tempo.

Você encontra com facilidade os episódios no Youtube. Rever eles hoje é uma experiência que choca e suscita uma poderosa reflexão: como pudemos nos perder tanto em tão pouco tempo?

No quinto episódio, o foco está no drama do aluno Jaime (Jorge Granillo), filho de um simplório e bondoso mecânico, que, por ser desleixado com seu caderno, não consegue realizar seu sonho, nunca é chamado para a patriótica Cerimônia da Bandeira. No mesmo episódio, o gentil Davi (Joseph Birch), para proteger sua amiga Valéria (Christel Klitbo), que havia feito uma travessura na hora do recreio, acaba se colocando como o culpado e sendo castigado, situação que se resolve quando a professora, orgulhosa da atitude do menino, elogia seu cavalheirismo.

No segundo episódio, temos o drama da introvertida Carmen (Flor Eduarda Gurrola), que sofre e é prejudicada em seu rendimento escolar porque seus pais estão se separando. Ao conversar com o pai, que ama muito, o texto exibe uma qualidade poética pouco usual no gênero, ele tenta consolar a filha afirmando que ela já é uma mocinha, no que a pequena, com olhar triste, responde: “Não papai, eu ainda não sou uma mocinha, não sei se pode fazer alguma coisa, ou se mamãe pode fazer, eu só sei que este é um problema das pessoas grandes, eu sou só uma menina que não quer chegar a ser mocinha enquanto meus pais não estiverem juntos.”

O homem, impactado ao constatar a maturidade forçada pela dor da pequena, tenta colocar a culpa na vida, no que ela complementa: “Não, papai, não é a vida, são vocês”. Ele, como argumento derradeiro, afirma que nem sempre conseguimos o que queremos, reforça que adoraria ver um sorriso no rosto da filha, não as suas lágrimas. A pequena então, forçando um sorriso, prova seu amor: “Não vê que estou sorrindo para você?”

Saudade da época em que o setor cultural respeitava o público infantil e se preocupava em formar pessoas de bom caráter. Ao mostrar crianças falando educadamente, utilizando até palavras rebuscadas mais confortáveis nas bocas dos adultos, a telenovela estimulava que elas, por repetição, pelo exemplo, tentassem inconscientemente imitar na vida real.

Eu vivi isto na infância, meus colegas de classe se inspiravam nas histórias de “Carrossel”, tínhamos uma professora que era linda e carinhosa, uma diretora firme, os bagunceiros que se identificavam com o Paulo (Mauricio Armando), as esfomeadas que eram chamadas de Laurinha (Hilda Chávez), até mesmo um empregado boa praça da limpeza que apelidamos de Firmino (Augusto Benedico).

O que as crianças de hoje imitam? Como os pais contribuem negativamente neste sentido, ao entregar seus filhos, sem preocupação, nas mãos de um sistema doente que está mais preocupado em ensinar às mentes em estágio inicial de formação um dialeto nonsense e normalizar o absurdo de banheiros únicos para meninos e meninas? E, principalmente, como esperar bons frutos desta realidade grotesca? Quais pais genuinamente se preocupam em, constatando a situação vergonhosa da cultura atual, proteger os pequenos, apresentando materiais antigos de qualidade, facilmente acessíveis, forjando para eles uma couraça existencial que sistema podre algum será capaz de destruir?

“Carrossel” fez um sucesso tremendo na época em que foi exibida no SBT, deu trabalho para a Globo, provando que, desde sempre, a maioria silenciosa brasileira é conservadora e preza o respeito pela família e pela pureza das crianças.

Octavio Caruso

Viva você também este sonho...

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