Encaixotando Helena (Boxing Helena – 1993)
Um cirurgião (Julian Sands) obcecado toma medidas extremas para garantir que a mulher (Sherilyn Fenn) que ele deseja dependa dele.
A inesquecível bomba dirigida pela filha do grande David Lynch. Esta fita causou rebuliço na época, não parava nas prateleiras das locadoras de vídeo. Os meus pais alugaram o VHS escondidos, já que não queriam que eu assistisse.
Não havia internet, o boca a boca era poderoso, pessoas que diziam que nunca tinham alugado nada mais chocante. O gerente do estabelecimento, querendo lucrar, contava para os clientes que alguém já tinha devolvido a fita com raiva, reclamando que a esposa chegou a passar mal assistindo, uma informação que era praticamente um cheque assinado em branco, o cliente pagava até uma locação a mais, somente para que a fita ficasse mais tempo em seu poder.
O meu pai trouxe o estojo preto numa sexta à noite, sem fazer alarde. Claro que acabei assistindo antes deles. E, com o olhar de uma criança que devorava livros, na metade eu já sabia que tinha perdido meu tempo com uma grande bobagem. Em teoria, a obsessão de um médico por uma garota, levando-o ao ponto de cortar seus membros e encaixotá-la, tinha tudo para resultar em um filme fantástico, mas a solução encontrada no terceiro ato é, no mínimo, frustrante.
O conceito é uma fonte filosófica maravilhosa, abre espaço para discussões sobre idealização, complexo de Édipo, sobre o desejo humano de ser deus, algo, por si só, doentio, controlar o incontrolável, transformar o outro objetivando a satisfação própria plena, sem concessões, mas a forma que o roteiro encontra para trabalhar estes temas, a utilização do desmembramento, do encaixotamento literal na alegoria, proporciona mais momentos cômicos involuntários do que cenas que suscitem reflexões.
O clima de sensualidade remete às obras do diretor italiano Tinto Brass, o que não é exatamente um elogio, as tentativas de incutir poesia, lirismo, acabam sendo frustradas pela entrega pouco inspirada do elenco.
“Encaixotando Helena” é definitivamente um guilty pleasure (prazer com culpa), tenho na coleção, por vezes, inexplicavelmente sinto vontade de rever, considero sua imperfeição algo fascinante.
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