Marcelino Pão e Vinho (Marcelino Pan y Vino – 1955)
Em uma vila espanhola, o padre franciscano Luís conta a uma menina doente a lenda de Marcelino (Pablito Calvo): um bebê deixado na porta do mosteiro e que, após várias tentativas frustradas de entregá-lo para adoção, acaba sendo cuidado e criado por doze frades da irmandade. Certo dia, ele oferece, durante sua refeição, um pedaço de pão e um pouco de vinho a uma imagem de madeira de Jesus, que aceita a oferta e passa a conversar com o menino. É o início de uma grande amizade.
Eu estudei toda a infância e adolescência em colégio de freiras, o Nossa Senhora da Ressurreição, lá era comum a exibição de filmes religiosos em uma sala especial com projetor, as queridas funcionárias preparavam até pipoca, um ritual muito bacana, o incomum era que alguma criança conhecesse mais sobre as obras do que as professoras.
No início, o fato de eu já ter alugado as fitas causava estranhamento, mas elas acabaram se acostumando e, em algumas situações, até ajudei a encontrar filmes mais raros em outras locadoras.
“Marcelino Pão e Vinho” já havia sido assunto com meus pais em casa algumas vezes, antes de assistir ao filme em VHS, eu já me emocionava com a história, lembro que achava linda a capa desenhada do original de José María Sánchez Silva no catálogo do saudoso Círculo do Livro, edição que acabei adquirindo muitos anos depois em meus garimpos nos sebos.
A experiência com o filme na escola não foi muito agradável, os meus colegas não se mostraram interessados, mas eu não me choquei, eu sempre me senti um avô naquele ambiente. Ao final da sessão, enquanto a garotada corria aliviada para jogar futebol na aula de educação física, eu fiquei na sala conversando sobre a trama com as freiras.
A produção espanhola, dirigida pelo húngaro Ladislao Vajda, encanta principalmente pela sensibilidade com que aborda o tema, uma delicadeza que infelizmente se perdeu nos dias de hoje. No Brasil, o sucesso foi avassalador, as salas de cinema lotadas, os olhos marejados, a nação se emocionou com a ternura do pequeno Pablito Calvo.
Analisando de forma fria, cínica, tecnicamente há problemas, fragilidades escancaradas, desequilíbrio de ritmo, mas a mensagem é tão linda que compensa tudo, e, mais que isto, a forma como ela é passada, sem firulas pseudointelectuais, atinge diretamente o coração do público, comovendo pela pureza inerente às cenas, logo, a obra é extremamente competente na execução de sua proposta.
Todos se recordam com carinho das sequências em que Marcelino conversa com Jesus, sempre me emociono no breve momento em que o menino, com medo da tempestade, busca conforto com seu amigo Jesus.
Eu já testemunhei ateus ferrenhos chorando copiosamente no desfecho, talvez, um genuíno milagre, o belíssimo momento em que a criança sinaliza que o prêmio que mais deseja é viver com Deus no céu, finalmente conhecer sua mãe, algo que ele considera mais gratificante do que a própria vida. Só de escrever sobre a cena, as lágrimas já escorrem em meu rosto.
Um tesouro do cinema espanhol que, não somente merece, precisa urgentemente ser redescoberto. Transmita suas mensagens sobre fé e solidariedade aos filhos pequenos…
Trecho da obra:
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Que belo texto sobre um belo filme. Sigo tua escrita há algum tempo e sempre me encanto pelas resenhas de filmes que conheço ou que desejo conhecer - o que faço, motivada por ti. Obrigada.
Querida Anabela, grato demais por valorizar meu trabalho. Espero contar sempre contigo na jornada. Bjão!!
Marcelino, pão e vinho foi o terceiro filme que assisti no cinema. Eu era um menino e até hoje me emociono com qualquer citação que vejo tamanha a marca que deixou em minha vida. Belo texto! Que bom ter essa sensação de novo!