Império da Luz (Empire of Light – 2022)
Na Inglaterra dos anos 1980, Hilary (Olivia Colman) é uma coordenadora deprimida que trabalha no Cinema Empire. O seu trabalho é vender ingressos e manter o estabelecimento em ordem. Ao seu lado, há outros funcionários: o gerente mal-humorado Sr. Ellis (Colin Firth), o dedicado projecionista Norman (Toby Jones) e os assistentes Neil (Tom Brooke) e Janine (Hannah Onslow). Mas apesar de estar tratando seu quadro depressivo, Hilary vive um estado de tristeza e solidão profundos. Tudo muda quando o Cinema Empire contrata Stephen (Micheal Ward), um novo funcionário que logo cria uma conexão com a gerente.
O início, com a bela trilha sonora de Trent Reznor e Atticus Ross, mostrando ambientes do Cinema Empire com as luzes apagadas, antes da chegada da coordenadora, transmite a sensação de abandono, elemento captado perfeitamente na fotografia do grande Roger Deakins, metafórico velório das salas de exibição, uma mensagem muito atual, já que o imediatismo tecnológico e o processo de infantilização dos adultos transformaram o elegante ritual cultural em passatempo pueril, a queda de público só piorava ano a ano, a farsa sanitária global apenas jogou a última pá de cal.
O roteirista/diretor Sam Mendes, o mesmo que em seu excelente projeto anterior, “1917”, lançado em 2019, alertava em simbolismo que o portador da verdade teria que atravessar um inferno se quisesse salvar a segunda leva de soldados da enganação fatal orquestrada pelo inimigo, retorna agora com uma delicada carta de amor às antigas e majestosas salas de cinema.
Ela inicialmente apresenta como uma máquina o serviço para o novo funcionário, visivelmente entediada, e recebe com estranheza a curiosidade e o brilho no olhar do jovem, que pede para visitar uma área que, em teoria, não poderia ser acessada. Ao adentrar com ela, o rapaz se surpreende, mais salas totalmente abandonadas, destruídas, espaços que pensavam cinema como, acima de tudo, oportunidade de comunhão fraterna entre estranhos apaixonados pela arte, lembranças melancólicas de um período em que havia maior demanda popular.
– “Que lugar lindo…” (Stephen)
– “É, ele era bem bonito mesmo…” (Hilary)
– “Ainda é…” (Stephen)
A câmera então sutilmente mostra o inesperado sorriso no rosto da mulher que, até minutos antes, havia decidido que não via sentido em viver. E sobra até espaço para uma pequena cena em que Hilary defende passionalmente algo em desuso na indústria, o absoluto respeito pelo público pagante.
Hilary consegue, graças ao amor que sente por Stephen, reconectar-se com o mundo. Neste sentido, vale destacar a homenagem ao clássico “Muito Além do Jardim”, com Peter Sellers. A obra estabelece em primeiro plano o efeito da chegada do rapaz na rotina da mulher, o novo olhar deslumbrado que ressignifica uma existência que parecia perdida, e, no alegórico segundo plano, a tocante esperança de que aconteça o mesmo entre o cinema e o público.
O filme já nos conquista pelo coração logo nos primeiros 20 minutos, mas o problema é que, de forma nada orgânica, o roteiro no segundo ato se desvia desta abordagem lírica e, em momentos que, de tão pouco fluidos, parecem ter sido enxertados posteriormente, força a mão em dois pontos importantes da agenda woke, o preconceito racial e o patriarcado. No terceiro ato, Mendes consegue poluir ainda mais o resultado, inserindo com fórceps conotações políticas, quebrando definitivamente o encanto.
“Império da Luz” é um filme intensamente problemático, a injustificada longa duração prejudica ainda mais a eficiência sensorial da experiência, mas traz pequenos belos momentos e a presença sempre brilhante de Olivia Colman.
Cotação:
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