Asteroid City (2023)
O filme decorre numa cidade ficcional em pleno deserto americano, por volta de 1955. O itinerário de uma convenção de Observadores Cósmicos Jr./Cadetes Espaciais (organizada com o objetivo de juntar estudantes e pais de todo o país para uma competição escolar com oferta de bolsas escolares) é espetacularmente perturbado por eventos que mudarão o mundo.
O filme, em sua estrutura metalinguística, versa basicamente sobre as mentiras pateticamente teatralizadas que são utilizadas desde sempre nos processos de engenharia social pelos seus arrogantes arquitetos, que, exatamente como o menino irritante e mimado na trama que constantemente tenta se provar relevante ao cumprir desafios, enxergam umbilicalmente o mundo como um parque de diversões particular.
Se você já despertou e foi convidado para algum evento maçônico liberado para visitantes, cunhadas e sobrinhos, por exemplo, sabe como aqueles que detém informações privilegiadas se orgulham do fato de que não é necessário muito esforço para manter a massa conectada às narrativas falsas, a grande maioria realmente nem deseja questionar o que se vende como verdade, e, pior, boa parte destes se enfurece com os poucos lúcidos que tentam alertar sobre a enganação. E o senso de humor único de Wes Anderson, com seu estilo intensamente farsesco, consegue captar o insólito inerente ao tosco senso de superioridade que mantém os titereiros e suas marionetes dançando no palco da vida.
O segredo para aproveitar ao máximo a experiência sensorial do diretor é se deixar levar, sem procurar destrinchar cada cena, qualquer outro caminho pode levar ao rápido cansaço. O simbolismo é óbvio, sinalizado de forma mais direta na frase que é repetida várias vezes em seu desfecho: você não pode acordar se não dormir. A alegoria leva a uma constatação triste, a figura do trem em movimento representando a impossibilidade de tomar o controle do tabuleiro, vivemos como atores de uma peça, memorizamos falas, acertamos as marcações, mas estamos confinados na imaginação do dramaturgo/arquiteto.
A execução da proposta é fascinante, a intenção principal é te fazer rir, o tom e o ritmo vão gradativamente conduzindo o espectador sagaz à percepção de que o cotidiano é sustentado por situações tão bizarras quanto aquelas que são defendidas de forma mecânica pelo elenco. Qualquer dúvida neste sentido foi eliminada com os acontecimentos dos últimos três anos. E Anderson está ciente disto, ele espertamente utiliza o (com sorte) aprendizado global no segundo ato, quando um hilário contato extraterrestre provoca uma quarentena em Asteroid City.
A mercadologicamente corajosa realidade da obra é que, com exceção de seus méritos de estilo, a assinatura criativa sempre firme do realizador, não há muito na trama para quem segue dormindo, já prevejo que será tida como insuportável por uma considerável parcela do público.
O resultado não intenciona agir como despertador, Anderson, ao zombar do conceito de storytelling, e, por conseguinte, da fragilidade de seus alicerces, prega para convertidos, uma decisão artística que deve ser respeitada.
Após o fraco “A Crônica Francesa”, o diretor felizmente retorna à boa forma.
Cotação:
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