O Portal do Paraíso (Heaven’s Gate – 1980)
Conto épico do oeste americano das décadas finais do século 19. A história começa no dia da formatura de dois estudantes da Harvard e acompanha o destino dos dois formandos que acabam em lados opostos na disputa agrária conhecida como Guerras do Condado de Johnson no estado do Wyoming em 1870.
O jovem Michael Cimino havia conquistado a atenção dos críticos com seus roteiros para “Corrida Silenciosa” (1972) e “Magnum 44” (1973), a segunda aventura do personagem Dirty Harry. Clint Eastwood ficou tão impressionado com o talento dele, que possibilitou a estreia do rapaz na direção: “O Último Golpe” (1974), um FILMAÇO que merece ser redescoberto.
Cimino então, aproveitando sua oportunidade de brilhar no momento em que a indústria norte-americana estimulava cineastas autorais e criativos, o auge da “Nova Hollywood”, entregou um dos filmes mais importantes do período, o visceral “O Franco Atirador” (1978), um relato brutal das consequências psicológicas da Guerra do Vietnã, com Robert De Niro, Christopher Walken, John Cazale e Meryl Streep.
O esforço foi abraçado com tanto carinho pelo público e pela imprensa, faturou várias estatuetas na cerimônia da Academia, incluindo o prêmio máximo, que os encantados executivos presentearam o jovem oscarizado com total liberdade em seu próximo projeto.
Ele poderia ter optado pelo caminho mais cômodo, alguma bobagem com potencial mercadológico, mas, como sua referência artística era o mestre italiano Luchino Visconti, Cimino respeitou o público e se dedicou plenamente em cada estágio do que viria a se tornar “O Portal do Paraíso”.
A escala épica, o refinamento em cada detalhe na recriação daquele recorte histórico, o preciosismo em cada cena, por mais simples que parecesse ser, foi um tremendo desafio para toda a equipe. Um dos objetivos era facilitar uma imersão profunda do espectador naquela época, no Velho Oeste sujo, empoeirado, realista, a antítese da imagem mitificada eternizada no clássico faroeste hollywoodiano.
O estilo da filmagem retirava o elenco de sua zona de conforto, por exemplo, as atrizes viveram uma semana em um bordel para que a representação fugisse da caricatura óbvia. Kris Kristofferson precisou repetir ad nauseam, mais de cinquenta vezes, o breve momento em que, acordado por um tapa, antes mesmo de levantar da cama, afugenta um grupo com seu chicote.
O diretor precisava que a corda estalasse em um ponto exato da porta, favorecendo o enquadramento proposto na fotografia do brilhante Vilmos Zsigmond. O resultado, apesar de desgastante para todos os envolvidos, justifica a atitude drástica. A beleza da sequência é inegável. O cansaço é temporário, o filme é eterno.
Nos bastidores, a dedicação extrema começou a extrapolar o orçamento, Cimino aguardava horas para que o clima propiciasse a iluminação perfeita de uma cena que durava poucos segundos na tela, os produtores inicialmente controlaram o nervosismo com a esperança de que o resultado seria tão espetacular que compensaria o prejuízo.
As reuniões foram ficando cada vez mais tensas, a grandiosidade da produção, de elementos técnicos como figurino e cenários ao número absurdo de figurantes, evocava a época áurea do “Ben-Hur”, de William Wyler, uma aposta muito arriscada.
O caos, alimentado maldosamente pelas manchetes negativas da imprensa, prejudicou o processo, não havia como gerar lucro nas bilheterias mesmo levando em consideração as salas lotadas. A expectativa otimista passou a ser o projeto eventualmente se pagar sem arranhar demais a reputação do estúdio.
A maior injustiça começa exatamente no ponto em que o diretor finalmente entrega o corte final da obra. Todos os méritos do produto não significavam nada, ele precisava desesperadamente lucrar muito. E, naquele período específico na indústria, a infantilização escapista vendia mais ingressos.
Os executivos, desamparados ao final da sessão privada, soaram o alarme, o único jeito daquele produto dar lucro era a propaganda negativa, afinal, faz parte da natureza humana querer “pagar para ver” se algo é realmente tão desastroso.
O material humano nesta equação não vale nada. O empenho do diretor e da equipe foi jogado no lixo, a campanha destrutiva manipulou facilmente os profissionais mais inseguros e covardes da crítica, textos implacáveis foram publicados detonando vários aspectos da produção, o filme virou sinônimo de fracasso retumbante por décadas, a carreira de Cimino foi enterrada de forma nada digna.
O curioso é que se você assiste hoje ao filme sem saber deste contexto, não há como suspeitar que foi tão atacado em sua estreia. Ele é lindo, emocionalmente maduro, uma experiência imersiva verdadeiramente fascinante.
Como é possível que os críticos da época afirmavam que era um tédio insuportável, o pior filme já feito? O que eles declarariam sobre o estado atual desta arte? No bobo cinema moderno, um adulto paga ingresso para aguentar três horas de personagens unidimensionais com uniformes coloridos soltando raios pelas mãos.
O legado do saudoso Michael Cimino merece ser reavaliado com carinho e responsabilidade. “O Franco Atirador” não sobreviveu tão bem no árduo teste do tempo, mas “O Portal do Paraíso” só melhora a cada revisão. Um filme de gente grande para gente grande, algo em extinção…
Eu selecionei abaixo os meus três temas favoritos na linda trilha sonora composta por David Mansfield:
Ella’s Waltz:
Moonlight:
End Credits:
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