Golpe de Sorte em Paris (Coup de Chance – 2023)
Fanny (Lou de Laâge) e Jean (Melvil Poupaud) parecem o casal ideal – ambos são profissionalmente bem-sucedidos, vivem em um apartamento lindo em um bairro exclusivo de Paris, e parecem estar tão apaixonados quanto estavam ao se conhecerem. Mas quando Fanny esbarra acidentalmente em Alain (Niels Schneider), o antigo colega de escola que se tornou escritor, ela fica encantada. Eles logo retomam o contato e se aproximam cada vez mais.
Woody Allen é o meu roteirista/diretor favorito desde a adolescência, e, neste novo trabalho, o quinquagésimo em sua linda, coerente e incomparável carreira artística, o mestre se exibe mais lúcido do que nunca, com sua verve cômica afiada, utilizando como leitmotiv a importância de se respeitar o elemento do acaso nesta aventura improvável que é a vida.
A belíssima Fanny teve um relacionamento ruim, a necessidade imediatista de afogar as mágoas e mascarar a insegurança acabou empurrando sua jovem figura na direção de um adulto infantilizado, Jean, um homem de negócios misterioso que torra uma grana obscena para brincar de trenzinho, enquanto exibe sua esposa-troféu em eventos sociais vazios, entediantes, com endinheirados fúteis, patéticos.
Tudo na rotina dela é falso, frágil, o comodismo amansou a fera existencial, silenciou os objetivos, apenas a sua doce mãe, vivida por Valérie Lemercier, apaixonada por literatura detetivesca, parece se importar com o rumo da sua escolha amorosa. E exatamente quando este lastimável conforto começava a extrair o brilho do olhar, o acaso possibilita um caminho diferente, o reencontro com Alain, antigo colega de escola.
Falante, vivaz, o rapaz não perde tempo, confessa que era apaixonado por ela, mas que tinha vergonha, ele ainda não havia conquistado a segurança advinda de sua vida intelectual. Os encontros, inicialmente formais, passam a suprir as lacunas sentimentais de Fanny. Alain, sendo escritor, apresenta a ela um universo cultural desconhecido, introduz poesia e gentileza em seus dias, enxergando nela a mulher maravilhosa que estava anulada, escondida sob os escombros da vaidade tola do marido.
Woody, com a leveza inteligente de sempre, direciona a história no segundo ato para uma reviravolta esperta, homenageando Georges Simenon e Claude Chabrol, entregando uma obra acima da média, mantendo seu estilo e, principalmente, superestimando a inteligência do público, uma atitude elegante e mercadologicamente corajosa.
“Golpe de Sorte em Paris” é impecável em sua proposta.
Cotação:
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