Um Estranho no Ninho (One Flew Over the Cuckoo’s Nest – 1975)
Um pequeno criminoso (Jack Nicholson) finge insanidade para cumprir sua pena em uma ala psiquiátrica em vez da prisão. Ele logo se vê como um líder para os outros pacientes — e um inimigo para a enfermeira (Louise Fletcher) dominadora que comanda a ala.
Este clássico foi um dos filmes fundamentais em minha formação como apaixonado por esta arte, o meu primeiro contato com ele foi na pré-adolescência, gravado em VHS de uma exibição televisiva noturna.
O tom da obra causou um profundo impacto, eu lembro que fiquei fascinado pela proposta da história, a perturbadora trilha sonora composta por Jack Nitzsche não saiu da minha cabeça por dias, utilizei a trama como referência em várias redações escolares.
Alguns anos depois encontrei o livro original de Ken Kesey nos meus garimpos pelos sebos, edição da Record, com o Jack Nicholson na capa, devorei as páginas na mesma semana.
Nas revisões ao longo dos anos, o filme só melhorou, a minha maturidade psicológica enriqueceu ainda mais o aspecto filosófico, a experiência da vida (principalmente nos últimos quatro anos) tornou ainda mais evidente na narrativa o lado sombrio da medicina, a necessidade da dependência do paciente para garantir o lucro constante da instituição.
O roteiro de Lawrence Hauben e Bo Goldman potencializa o elemento que cativou o jovem produtor Michael Douglas: o indivíduo confrontando o sistema.
Quando assistiram a “O Baile dos Bombeiros” (1967), enxergaram no diretor tcheco Milos Forman a audácia necessária para equilibrar bom humor e acidez crítica no cenário caótico de um manicômio.
Jack Nicholson, com sua persona vibrante e segura, contrastando com a inegável psicopatia da cruel enfermeira-chefe vivida pela Louise Fletcher, entrega sequências verdadeiramente brilhantes. Ela representa o fantoche perfeito, alguém capaz de cumprir as ordens mais desumanas, sem sinal de remorso.
Os pacientes, exibindo variados níveis de fragilidade, compartilham o respeito às regras imposto pelo medo da punição. Eles atravessam as semanas sem dignidade, sem voz, tomando as medicações nas horas determinadas, fadados ao adoecimento físico e mental eterno para suprir as demandas do estabelecimento.
O enigmático indígena, vivido por Will Sampson, alto, silencioso, observa tudo e todos, o único que não busca se adequar de forma alguma àquela realidade, ele, metaforicamente, marcha ao som de seu próprio tambor.
Aos olhos dos dominadores, uma figura inofensiva. Ele é indomável e parece prever o fim da intensa rebeldia do novato barulhento, algo que conduz ao inesquecível desfecho, um gesto de misericordioso respeito.
Na alegoria, o único caminho para se sobreviver em um cenário doentio e injusto é sumir na multidão, operar nas sombras, até que haja uma real oportunidade de fuga. Aquele que se destacar, como louco ou como herói, caso não consiga ser corrompido e manipulado, será inevitavelmente eliminado.
A chama libertária que ambos carregam pode influenciar as vítimas já amansadas, exatamente o que todos os sistemas totalitários temem.
Trilha sonora composta por Jack Nitzsche:
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