Quando o Coração Floresce (Summertime – 1955)
Uma mulher (Katharine Hepburn) americana madura e solteira sonha com um belo romance. De férias em Veneza, conhece um charmoso italiano (Rossano Brazzi), que acredita ser seu grande amor, porém ele é casado. O seu sonho, então, transforma-se em uma amarga realidade.
Se algum dia o cinema como arte acabar, virar literalmente uma peça obsoleta de museu, esta obra do saudoso mestre britânico David Lean será utilizada como elemento representativo das potencialidades desta ferramenta.
E, da mesma forma que hoje, no abismo civilizacional em que vivemos, enxergamos com assombro a beleza e a complexidade das realizações arquitetônicas do passado, lutando para compreender como pensavam os homens daquele tempo, neste futuro hipotético certamente apocalíptico os jovens terão contato com a elegante fotografia de Jack Hildyard em “Quando o Coração Floresce”, e, boquiabertos, custarão a crer que as imagens não são fruto de uma inteligência artificial desafiada a criar uma realidade alienígena mais refinada.
Este era o filme que o diretor mais amava em sua carreira, você realmente sente o alto nível de dedicação em cada cena, o encantamento com as locações, além da tremenda confiança na sua protagonista.
Katharine Hepburn estava especialmente inspirada, a forma como ela desenvolve o arco narrativo da personagem, da amargura solitária em que inicia a viagem ao orgulho na cena final por ter conquistado o coração de seu admirador, sem resvalar nos atalhos melodramáticos usuais, comprova sua inteligência emocional.
A sua entrega nos primeiros momentos evidencia a origem simples de Jane Hudson, ela se irrita quando sente dificuldade em se adaptar rapidamente aos hábitos do local, qualquer mínimo equívoco faz ressurgir em sua mente várias crenças limitantes que alimentou na sua juventude. A sua presença em Veneza simboliza mais do que apenas férias, descanso, ela saboreia cada segundo porque é a sua vitória pessoal, ela trabalhou muito para conseguir pagar a viagem.
A câmera busca em várias situações reproduzir no público a sensação que cada nova experiência causa na turista, o deslumbramento ao virar da esquina. Mas a beleza sedutora do local começa a salientar a sua solidão, a melancolia gradativamente subjuga a percepção infantil da surpresa, ela então ativa o sistema de autoproteção psicológica, bloqueando qualquer possibilidade de contato romântico sincero.
E, exatamente quando acreditou estar imune à apreciação de outrem, durante uma tarde na Piazza San Marco, a sua frágil figura atrai a atenção do enigmático Renato de Rossi, que lia tranquilamente seu jornal em uma mesa próxima. A reação dela ao perceber que estava sendo educadamente admirada à distância sublinha o medo que tenta desesperadamente esconder por trás da fachada de mulher independente.
Um detalhe curioso é que o homem trabalha como negociante de antiguidades, há uma simbologia discreta, como se ele servisse para relembrar à Jane valores que já naquele período estavam sendo abandonados. A decisão dela ao final pontua que, apesar de tudo, a experiência fortaleceu seu caráter, ela se permitiu ser amada.
O público sabe que a diversão está em acompanhar a durona Hepburn se entregar lentamente à paixão, Lean sabia mais do que ninguém, ela sempre subverteu os clichês da fórmula, injetando uma dose extra de honestidade, e, desta feita, há espaço generoso para a atriz esculpir carinhosamente esta corajosa transição mental.
Trilha sonora composta por Alessandro Cicognini:
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