Inocência (1983)
No século 19, Inocência (Fernanda Torres), uma garota do interior, é seduzida por um jovem médico (Edson Celulari) que está tratando-a e também está hospedado em sua casa por alguns dias. Ela tenta esconder o romance proibido de seu pai, que desaprova o relacionamento.
A filmografia do brasileiro Walter Lima Jr. é bastante problemática, apesar de, claro, ser abraçada carinhosamente por alguns colegas que exageram na desesperada cegueira ufanista. Vale destacar que respeito sobremaneira os seus esforços iniciais como crítico, especialmente por ele defender o cinema popular e atacar o Cinema Novo e o endeusamento de Glauber Rocha pelos acadêmicos nacionais.
Voltando aos seus filmes, “A Ostra e o Vento”, sem dúvida o melhor em aspectos técnicos, eu considero de uma pretensão vazia e verdadeiramente insuportável. Outros títulos, como “O Monge e a Filha do Carrasco”, “A Lira do Delírio” e “Através da Sombra”, são simplesmente ruins em estética e, principalmente, em execução. Com uma dose generosa de boa vontade, posso enxergar traços redentores nos medianos “Na Boca da Noite”, “Brasil Ano 2000”, “Chico Rei” e “Menino de Engenho”, sua estreia na direção em 1965.
O melhor momento de sua carreira até hoje é a pérola de pura sensibilidade: “Inocência”, adaptada fielmente do livro do Visconde de Taunay, inspirado por um romance real do nobre com uma cabocla comprada no Mato Grosso, que faleceu de tristeza após sua partida. A história já havia sido levada para as telas em 1915, pelo pioneiro Vittorio Cappelaro, e, após atrair a atenção do grande Humberto Mauro, teve uma segunda chance nas mãos de Lulu de Barros, em 1949.
Apaixonado pelo livro, mas receoso por arriscar uma temática tão poética e doce, numa fase em que a frágil indústria brasileira apostava apenas em projetos engajados politicamente, ele trabalhou o conceito por alguns anos, até que, durante o processo de finalização de “Chico Rei”, enxergando naquela missão uma oportunidade de realizar o sonho criativo de colegas como Mauro e Lima Barreto, responsável pelo roteiro, Walter decidiu enfrentar o desafio, encontrando na elegante direção de fotografia de Pedro Farkas uma parceria perfeita, operando verdadeiros milagres com o baixo orçamento.
Um dos maiores acertos foi substituir sempre que possível os diálogos pela simbologia das imagens, compondo delicadas metáforas visuais, como o lindo esvoaçar do lençol que protege a menina no desfecho, buscando firmar conexão emocional com o público.
Quando o cineasta demonstra segurança intelectual e não tenta impressionar o espectador com sua (pretensa) inteligência, algo que usualmente desemboca em bobagens umbilicais glauberianas, consciente de que o maior refinamento é a simplicidade, a obra se torna atemporal.
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