Deixem-nos Viver (Alice’s Restaurant – 1969)
Inspirando-se livremente na música “Alice’s Restaurant”, de Arlo Guthrie, um clássico da contracultura dos anos 60, Penn cria um dos retratos definitivos da cultura hippie no cinema.
O policial exigiu que ele entregasse o cinto, antes de ser preso, para evitar que ele se enforcasse na cela. Mas quem iria se enforcar por ter despejado lixo em local proibido? E depois ele cumpriu seu dever no alistamento militar para a Guerra do Vietnã, pulando junto com o psiquiatra do exército aos repetidos berros de: “Eu quero matar!” Dois trechos da canção de Arlo Guthrie que considero brilhantes em sua crítica.
O filme, protagonizado pelo próprio Arlo, se torna ainda mais fascinante para aqueles que já conhecem a história da música, um tesouro que precisava ser resgatado, já que continua eficiente e, até ouso dizer, narrativamente é mais impactante hoje. Penn conhecia o músico e não se sentia confortável em tomar parte na produção, mas encontrou o viés emocional que buscava no bem-humorado trecho final da canção: “Você pode conseguir tudo o que quiser no restaurante da Alice, menos a própria Alice.”
O foco do roteiro é um tema que o diretor prezava mais do que martelar os horrores da guerra, a cultura que estava sendo alimentada pelos jovens norte-americanos como uma fuga lúdica de todas as convenções ditadas por seus pais, representada na família formada por Arlo, Alice e seus amigos, a simbólica ceia que eles compartilham na igreja abandonada. O despejo do lixo, crime que impediu o alistamento, a hipocrisia inerente ao militarismo e sua cultura de padronização, destruindo o indivíduo.
Os temas são abordados de forma leve, coerente à ideologia hippie, culminando em um desfecho poderoso em sua opressiva “paz”. Alice, solitária na porta da igreja, vestida de noiva, reconhece internamente que o frágil sonho está fadado a acabar.
* O filme não está nas plataformas de streaming, mas você encontra em DVD e, claro, garimpando na internet.