Galo de Briga (Cockfighter – 1974)
O tema é repugnante, deprimente, como a maioria das cenas que envolvem as brigas de galos, mas é impressionante como o roteiro consegue humanizar o protagonista, vivido por Warren Oates, que fez voto de silêncio, nos poucos momentos em que ele é confrontado emocionalmente por suas mulheres.
Seria muito fácil adotar estereótipos, já que ele é um ser desprezível, capaz de vender a casa do irmão, apenas para conseguir comprar mais galos e sustentar seu vício de jogo. O mérito também é do ator, naquele que considero o melhor momento em sua filmografia, que se expressa com sutilezas no sorriso e no olhar.
O produtor Roger Corman, insatisfeito com esses relances de humanidade, especialmente com a frase final, em que o personagem declara que é amado, chegou a atirar a versão final do roteiro na parede após uma discussão com o diretor.
O diretor Monte Hellman inicialmente demonstrou incapacidade de ver as brigas de galos, o que chegou a preocupar o diretor de fotografia Nestor Almendros, mas acabou falando mais alto seu interesse pelas subculturas, em entender, antes de julgar.
Ele procurou transmitir para o público a mesma sensação de revolta que ele sentiu inicialmente, objetivo que fica latente no breve momento que sua câmera mostra uma criança chorando, enquanto os pais vibram na plateia, tapando os olhos com uma cédula.
Na tentativa de fazer com que a atriz Patricia Pearcy realmente vivesse o choque, ele não deixou que ela visse as brigas até filmar a cena final, para que a reação em seus olhos fosse a mais real possível.
A coragem do roteiro pode ser sintetizada na forma que o protagonista encontra, nos minutos finais, de demonstrar seu amor por sua mulher. Coerente, ainda que graficamente brutal, após ser questionado sobre sua devoção obsessiva aos galos de briga, Oates simplesmente tira a cabeça de seu galo campeão vivo com a bota, entregando-a na mão da mulher.
Por trás das cenas fortes, um estudo de personagem discreto, sobre a busca pela perfeição em uma profissão, mas também sobre a busca de ser plenamente aceito, com as imperfeições inerentes a todos, pela mulher que ama.