Os Libertinos (Les Dragueurs – 1959)
Quando se escreve sobre Nouvelle Vague, a crítica normalmente se foca nas obras mais ideologicamente pretensiosas. Eu gosto demais da atitude do diretor Jean-Pierre Mocky, pouco lembrado, que incitava em seus colegas o desprezo a toda a gordura extra de um filme, aquela pesada bagagem de clichês e fórmulas, que ele chamava de peso morto, o limitante rótulo de tradição de qualidade.
Ele estimulava que se filmasse tudo sem captação de áudio, como os cineastas italianos do neorrealismo, poupando despesas, deixando para inserir o som gravado na pós-produção. O interesse do rapaz estava na essência, não na forma. Essa liberdade é perceptível em seus primeiros trabalhos, especialmente em “Os Libertinos”.
Assistindo hoje, imaginando no contexto de sua época, fico impressionado com a ousadia dele em traçar uma analogia de sua sociedade, utilizando como microcosmo as divertidas paqueras de uma dupla de jovens pelas ruas de Paris. Não há tentativa alguma de intelectualizar a trama, que flui num ritmo bastante agradável, um clima muito diferente das experimentações, por vezes, entediantes, de seus colegas mais famosos.
O jovem tímido, vivido de forma adorável por Charles Aznavour, não tem preferências, qualquer garota que sorrir para ele já se torna uma possibilidade. Ele é gentil, solitário, não deseja nada da vida, apenas o necessário para seguir vivendo.
O conquistador extrovertido, vivido por Jacques Charrier, que idealiza a mulher dos sonhos, tentando encontrar ela nos rostos das jovens, atravessa o caminho do rapaz introvertido, no meio de uma caçada urbana por belas mulheres. Um não sabe absolutamente nada sobre o outro, o respeito nasce pelo interesse em comum.
Os artifícios utilizados nas tentativas desajeitadas de flerte, como o golpe da moeda, trabalhados na trama como habilidades estabelecidas de trambiqueiros profissionais, resultando em cenas que sempre me remetem, como uma espécie de paródia, ao sisudo “Pickpocket”, de Robert Bresson, que foi lançado no mesmo ano.
A dupla acaba sendo conduzida para uma decadente festa da alta sociedade, onde a promiscuidade exagerada, caricatural, evidencia a metáfora social. O que ocorre nessa noite agitada acaba moldando os rapazes, que são testados em suas convicções.
Aquele que se orgulhava de não se importar com ninguém, aprende a importância de se posicionar contra o que não concorda. É, no frigir dos ovos, um eficiente conto de maturidade.
Gostei muito das suas palavras sobre esse filme que vi na belíssima coleção da Versátil sobre a Nouvelle Vague.