Micróbio e Gasolina (Microbe et Gasoil – 2015)
Gondry nos acostumou mal com sua inventividade, em filmes
como “Sonhando Acordado”, “Rebobine, Por Favor”, e, especialmente, “Brilho
Eterno de uma Mente Sem Lembranças”. Quando terminou a sessão de “Micróbio e
Gasolina”, tentava puxar pela memória algum elemento no roteiro que tivesse
essa marcante impressão digital do diretor, sem sucesso.
É um road movie muito
agradável, com uma pegada lúdica encantadora, contando a história de dois
adolescentes: Micróbio, vítima de bullying por sua excessiva introversão, o que
explica o apelido pouco carinhoso, e Gasolina, vivido pelo ótimo Téophile
Baquet, um desajustado que não se importa com a imagem que os outros projetam
nele. Eles embarcam em uma viagem onde pretendem cruzar o país com um carro
montado a partir de sucata. Há um pouco de Truffaut em sua visão dos conflitos
da adolescência.
Já no design surrealista do veículo, uma casa com direito a telhado,
encontramos uma simbologia pouco sutil para o real interesse dos meninos,
antagônico ao conceito de fuga do lar: a necessidade de se sentirem seguros.
Não por acaso, a mãe de Micróbio, vivida por Audrey Tatou, está enfrentando um
divórcio. O destino programado é um acampamento que resgata em um deles uma
doce memória infantil, o psicológico desejo por voltar ao colo materno. Nada
disso fica aparente na atitude dos dois, que exalam uma postura até arrogante
de superioridade com relação aos outros de sua idade, o extravasamento
radicalmente oposto, como forma de disfarçar a insegurança. A câmera de Gondry
facilita a empatia do público, minimizando os cortes, evitando floreios
visuais, a quebra da ilusão, compondo um ritmo bastante lento, reflexivo,
verdadeiramente abraçando a jornada dos personagens.