Dirigido por Philip Dunne, que havia roteirizado “Como Era Verde Meu Vale”, e com roteiro do respeitado ganhador do Pulitzer: Clifford Odets, de “A Embriaguez do Sucesso”, baseado no criticamente bem-sucedido livro: “The Lost Country”, de J.R. Salamanca, o projeto era visto pelo produtor Jerry Wald como emocionalmente mais promissor que “Juventude Transviada”. Foi, sem dúvida, o último filme protagonizado por Elvis Presley com verdadeiro potencial dramático.
Coração Rebelde (Wild in The Country – 1961)
Glenn Tyler quer ser um escritor de sucesso, porém, os conflitos de sua vida pessoal parecem demais para ele, até que ele envolve-se romanticamente com três mulheres, uma rica, uma psicóloga e uma espevitada, as três querem levá-lo a curtição e loucura total.
A aura nos bastidores era de total comprometimento artístico, até certa arrogância, por parte do diretor e alguns membros do elenco, por estarem seguros de que iriam transformar aquele “veículo de Elvis” (comentado em tom depreciativo) em algo mais relevante do que os filmes anteriores, um melodrama freudiano, algo que estava na moda na época. A própria Millie Perkins, um dos pares românticos dele em cena, confirmou em entrevistas posteriores esta sensação de superioridade que dominava a produção: “Aquele era o pensamento de todos que estavam filmando: estamos realizando algo com mais classe do que estes filmes dele e somos muito melhores.”
A elegante Hope Lange foi contratada para o papel da psicóloga que acaba se apaixonando pelo jovem. E até mesmo Christina Crawford, filha adotiva de Joan Crawford, foi escalada para uma ponta. O diretor Philip Dunne elogiou o interesse de Elvis, que, desde o início, tentava tirar todas as dúvidas, sem o estrelismo de muitos astros menos famosos. Perkins também afirmou diversas vezes o quanto ela ficou encantada com a educação, por vezes, antiquada, do rapaz. Ele sabia que tinha mais uma chance de se afirmar como ator dramático, não iria desperdiçar, então fez de tudo para que este projeto fosse mais ousado do que “Balada Sangrenta” e “Estrela de Fogo”.
Os problemas começaram quando o produtor da Fox, Spyros Skouras, descobriu que o cantor iria protagonizar um filme sem sequências musicais. O chefão então ordenou que os compositores do estúdio criassem uma meia-dúzia de canções e jogassem na trama, sem se importar que, obviamente, não havia clima algum na história para que o protagonista soltasse a voz. Elvis, o produtor e o diretor, foram ao escritório em protesto, mas não conseguiram modificar a cabeça do homem de negócios. Dunne chegou a pedir demissão, mas Wald conseguiu acalmar os ânimos. Eles tiveram que assinar um acordo que garantia que as canções seriam incluídas no roteiro de forma que não poderiam ser cortadas na edição final. Toda a aura de superioridade foi minguando durante as semanas seguintes.
De fato, algo raro dentro da filmografia do astro, as músicas realmente foram incorporadas de maneira inteligente nas cenas. Aquelas que sobraram, já que, provavelmente quebrando o contrato, o diretor conseguiu cortar “Lonely Man” e “Forget Me Never”, deixando apenas as baladas “In My Way”, uma serenata curta para a personagem de Tuesday Weld, e a bonita canção-título, além da agitada “I Slipped, I Stumbled, I Fell”. Esta última, inserida numa sequência em que Elvis e Perkins estão numa caminhonete, transparece o profissionalismo do cantor, ainda que fique claro o desconforto dos dois.
A jovem atriz estava tremendamente desmotivada, sentia vergonha pelo absurdo da cena, sem nenhum sentido dentro do arco narrativo do protagonista, um escritor introvertido. Após alguns ensaios, o diretor se afastou dos dois, Elvis então se virou para a colega com um sorriso debochado e disse: “Deus, isto é tão embaraçoso. Ninguém nunca faria isto na vida real. Como eles podem me pedir para fazer algo assim?” Os dois então trocaram uma intensa gargalhada e bravamente filmaram a sequência. Analisando a cena com atenção, você consegue perceber este jogo dos dois, tentando fazer do limão azedo uma limonada.
Conheci o filme em 1997, ele vinha num box de VHS da Fox, com “Ama-me Com Ternura” e “Estrela de Fogo”. Dos três, foi a fita que mais passou tempo em meu aparelho de vídeo, já que rolava uma forte identificação com os conflitos do personagem, além do fato dele preferir mulheres mais velhas. “In My Way” foi uma das primeiras músicas que quis aprender no violão. Sempre achei que a Weld, numa ótima atuação como a prima atirada Noreen, estava emulando descaradamente os trejeitos do Kowalski de Marlon Brando, em “Uma Rua Chamada Pecado”.
Lange, Weld e Perkins, três maravilhosos motivos para rever com frequência a obra. E, claro, Elvis em seu último papel realmente desafiador. Um ótimo filme que merece maior reconhecimento.
A Seguir: “Feitiço Havaiano” (Blue Hawaii)