Polícia Federal: A Lei é Para Todos (2017)

Do início do processo até a condução coercitiva do ex-presidente Lula (Ary Fontoura), a Operação Lava Jato desencadeia uma série de investigações sobre a corrupção no Brasil.

“O sistema é feito para não funcionar”. A frase dita por um dos investigadores do filme sintetiza a coragem do roteiro em apontar que não há lógica em defender pessoas claramente envolvidas em falcatruas, figuras que enriquecem enquanto o povo que os colocou no poder luta para sobreviver chafurdando na lama, nem mesmo a desculpa da genuína ideologia pode ser sustentada. Já está claro que a resposta não está em partidos, a esperança reside em indivíduos íntegros. É questão de caráter, nunca deposite sua confiança em líderes que não compartilham os mesmos serviços que o coletivo de pessoas responsáveis por sua posição social.

Quando o filme “Polícia Federal – A Lei é Para Todos” foi lançado, eu percebi a clara intenção de boicote de parte do público e da crítica, atitude que sempre repudio, o instinto de censura serve apenas aos cretinos. Uma breve reflexão: a beleza do cinema é também a capacidade de abordar o mesmo evento por perspectivas diferentes. Você pode assistir a um clássico alemão de propaganda nazista e logo depois ver a resposta norte-americana incitando os jovens à guerra, “Suss the Jew” (1940) é antissemita até o talo, enquanto “Confissões de um Espião Nazista” (1939) desfere um soco de direita no queixo de Hitler.

Por este motivo não consegui acreditar quando li textos tentando deslegitimar a obra utilizando como base o argumento de que ela retratava a versão de apenas um lado da história. Não há argumento mais tolo, um desserviço à função da crítica como ferramenta filosófica que prima pela pluralidade de pontos de vista. Ficando no mesmo tema, “Lula, o Filho do Brasil” era imparcial? Que os dois filmes sejam vistos e analisados sem preconceito, nunca boicotados (ainda que de forma sutil), que a pluralidade de abordagens agregue à experiência de cada espectador. O crítico de cinema que toma partido antes de conhecer o filme está agindo de forma errada, estupidamente errada.

A utilização da narração em off como fio condutor da trama é um ponto negativo, o recurso quase sempre tenta disfarçar um roteiro frágil, prejudica a imersão e, neste caso específico, busca preencher lacunas que deveriam ter sido resolvidas no primeiro ato, para que o investimento emocional do espectador no desfecho não dependesse de um conhecimento prévio dos acontecimentos retratados.

O filme precisa funcionar sem muletas, precisa ser atemporal. Outro momento que considero desnecessário é aquele em que o grupo de investigadores festeja ao som de “Inútil”, do Ultraje a Rigor, a sequência é clichê, destoa do clima que havia sido estabelecido e não soa coerente na construção dos personagens envolvidos. Fora isto, não há grandes problemas.

A introdução em quadrinhos é muito boa como ideia e execução, traçando a corrupção desde o encontro de Cabral com os índios. A atuação do elenco afinada no mesmo diapasão é louvável, algo que era raro, mas que melhorou muito nos últimos anos. Vale destacar a forma inteligente com que os alívios cômicos são trabalhados, especialmente a construção do personagem do doleiro Youssef (Roberto Birindelli) em cenas como aquela em que ele debocha da forma física do delegado vivido por Antonio Calloni, culminando mais tarde na sua desconstrução ao ser questionado na cadeia pelo motivo de não fazer piada com a chegada de Odebrecht (Leonardo Medeiros).

Eu gostei do ritmo e, com as ressalvas apontadas acima, considero um importante passo no gênero de thriller político, vertente poucas vezes trabalhada no cinema nacional. Qualquer tentativa da nossa indústria de se aventurar fora da zona de conforto narrativa deve ser incentivada.



Viva você também este sonho...

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