Os Farofeiros (2018)
O roteirista Paulo Cursino é, como sempre afirmo, o principal responsável pela qualidade das modernas comédias nacionais. Neste novo projeto, com direção de Roberto Santucci, ele utiliza um tema que faz parte do inconsciente coletivo do brasileiro desde sempre, mas que nunca havia sido aproveitado no nosso cinema.
Inicialmente apontando os problemas, há uma cena desnecessariamente longa no banheiro durante o primeiro ato, apelando para flatulência como punch line, o simples não precisa ser simplório. O filme poderia ter aproveitado mais o cenário da praia, sendo coerente ao título. A gag da fobia da madame com anões de jardim se repete demais, o que acaba reduzindo o fator cômico da ideia no segundo ato. Dito isto, os pontos positivos superam os negativos.
Maurício Manfrini, comediante veterano na televisão que impressiona em seu primeiro trabalho no cinema, conseguindo a difícil tarefa de transpor o carisma imediatista da telinha para a tela grande, pode ser considerado, guardadas as devidas proporções, uma atualização do mulherengo Zé Trindade, já que a graça nasce principalmente da forma como ele elabora as frases e brinca com as palavras, deixando parecer que tudo é improviso, mérito do artista. Esta característica torna sua parceria em cena com Cacau Protásio, outra comediante que prima pela espontaneidade inteligente, um prato cheio para o roteiro. Com sorte, ainda veremos muitos filmes com ele, a comédia moderna nacional só tem a ganhar. Como não rir com frases como: “Criança não tem que ter celular, não tem que ter joguinho, na sua idade eu tinha era piolho”, ou “O bico do urubu já está beliscando a cueca”?
A subtrama envolvendo o colega do trabalho esquisito que namora a bonitona, papel que coube como luva nas mãos de Aline Riscado, não inova em nada no gênero, já foi utilizada em diversas produções, mas é executada com competência. Danielle Winits acerta o tom de desespero da madame, hilária, deliciosamente cartunesca, com destaque para a cena dela na “piscina verde”, em que a montagem insere convenções visuais do J-horror, com a atriz fisicamente exagerando dramaticamente cada movimento. Rocha, vivido por Charles Paraventi, exibe excelente timing cômico, suas cenas no espaço limitado do carro durante o engarrafamento são impecáveis.
Excelente sacada de emular a sequência clássica de “Apocalypse Now”, ao som da Cavalgada das Valquírias, de Wagner, no ataque de mosquitos à casa “rústica”, com direito à um arriscado interlúdio em animação, opção que salienta a segurança do roteirista com o material. Vale ressaltar também a sequência ambientada na sala de cinema, uma crítica direta aos pseudointelectuais que desprezam o humor popular, culminando com uma questão proposta pelo elenco que quebra a quarta parede, momento que remete às críticas mais veladas que os roteiros da Atlântida e Herbert Richers faziam como revide ao desprezo dos profissionais da crítica.
“Os Farofeiros” cumpre com louvor sua função. Comédia daquelas boas de ver em grupo.
Cotação: