1917 (2019)
Na Primeira Guerra Mundial, Will (George MacKay) e Tom (Dean-Charles Chapman), dois soldados britânicos, recebem ordens aparentemente impossíveis de cumprir. Em uma corrida contra o tempo, eles precisam atravessar o território inimigo e entregar uma mensagem que pode salvar 1600 de seus companheiros.
A cereja do bolo, uma simples e bonita dedicatória ao avô do diretor, Alfred Mendes, veterano de batalha, cujas histórias inspiraram o roteiro escrito pelo próprio Sam Mendes, com a ajuda de Krysty Wilson-Cairns, o coração pulsante nesta experiência cinematográfica impressionante, visceral e única em seu gênero, graças à fotografia do grande Roger Deakins, que utiliza longas tomadas para dar a impressão de que é uma filmagem contínua, com a câmera conduzindo o espectador para dentro do conflito.
Há truques disfarçados pela coreografia impecável, não haveria outra maneira, mas o efeito é alcançado com máxima fluidez, a imersão é imediata.
O virtuosismo técnico poderia se sobressair, até limitar o alcance narrativo da obra, mas ele apenas serve como facilitador sensorial, já que o carisma da dupla MacKay e Chapman convida o público a se importar com suas decisões, apesar de quase nada ser informado sobre eles, decisão consciente que alude à impessoalidade de soldados em batalha, em suma, a emoção brota naturalmente, sem os vícios narrativos melodramáticos tradicionais. É enriquecedor perceber como o companheirismo deles causa modificações relevantes na forma como cada um lida com a perigosa tarefa.
O design de produção, figurino, todos os elementos gritam autenticidade. O nível de tensão, até mesmo nas cenas em que acompanhamos os personagens caminhando no que parece ser um terreno menos arriscado, pode ser elevado exponencialmente com o design de som adicionando ao longe a aproximação de um avião, uma verdadeira aula de construção de suspense.
A trilha sonora de Thomas Newman merece destaque neste quesito, agregando um tom de estranheza constante, enfatizando o caráter surreal daquele cenário, deixando claro que não é permitido aos personagens sequer um segundo de segurança.
Há beleza e poesia na forma como Mendes escolhe iniciar e fechar sua trama com uma rima visual que representa a paz que todo combatente sonha reencontrar, ainda que o protagonista esteja envolto por caos e desesperança, refletindo o senso de cumprimento do dever.
A maioria dos seus similares faz uso do melodrama como disfarce para espetacularizar o conflito, Mendes vai na contramão, utilizando o triste espetáculo do conflito como disfarce para enaltecer a coragem do material humano. Ao fazer isto, ele transcende as convenções do gênero, propondo com sua estética uma homenagem ao poder da linguagem cinematográfica.
A primeira leva não teria como ser salva da arapuca, mas a esperança residia na bravura do rapaz que atravessou o território inimigo para revelar a verdade. “1917” te faz ficar sem piscar os olhos por duas horas sentado na beira da poltrona, desde já, um dos melhores filmes do ano.
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