Soul (2020)
Um músico (Jamie Foxx) que perdeu sua paixão pela música é transportado para fora de seu corpo e deve encontrar o caminho de volta com a ajuda de uma alma infantil (Tina Fey) aprendendo sobre si mesma.
Eu prometi a mim mesmo que não abordaria nesta crítica as patéticas reclamações dos militantes esquerdistas norte-americanos que precederam a estreia, que afirmavam (pelo trailer) que a obra era racista porque o protagonista negro passava boa parte do filme como uma alma de tom azul-claro, mas, considero importante reforçar logo de início que esta postura intensamente estúpida ressalta quão absurdos são os fundamentos da incitação de conflitos (sociais, raciais, fisiológicos etc.) como grosseira ferramenta política na agenda comunista desde sempre, os titereiros do caos enxergam pelo em ovo e contam com a aceitação imediata de uma massa intelectualmente preguiçosa, adestrada à acatar os sinais de comando.
Um dos toques geniais de “Soul” é, já nos primeiros minutos, evidenciar que todos somos iguais, reunindo almas de continentes diferentes no mesmo ambiente. É compreensível que esta simples ideia, inserida em um projeto direcionado às crianças, exatamente o público-alvo favorito dos mestres da confusão mental, tenha causado tanto incômodo, até porque, outro toque brilhante, também opta por remar contra a atual corrente cultural bestializante, valorizando música de qualidade, no caso, o Jazz clássico, ao invés de reduzir (como é usual hoje em dia) o personagem negro à caricatura malandra do Hip Hop.
Jazz, sinônimo de refinamento e elegância, é uma arte criada pelos negros no delta do Mississippi e em New Orleans no início do século 20, mas, como seu universo não se encaixa na agenda “progressista” moderna de vitimização, ela é jogada para baixo do tapete, assim como os grandes poetas negros sambistas dos morros brasileiros de outrora, como Cartola.
O roteiro é objetivo, sem gordura extra, sem firulas existencialistas, a mensagem é clara, explicitada nos primeiros minutos, quando vemos Joe ensinando música na escola para uma turma de crianças desinteressadas, uma tarefa que ele conduz displicentemente como uma ponte para algo mais, o sonho profissional de ser avalizado artisticamente como pianista.
Ele nem desconfia, mas naquela manhã o professor é quem recebeu o maior ensinamento de sua vida, uma menina introvertida e insegura, a única da turma que realmente demonstra prazer naquela atividade, acaba se deixando levar pela emoção da música e começa a improvisar, a tal fagulha que se tornará importante no segundo ato, os olhinhos fechados, algo mágico e inexplicável que a faz esquecer por alguns segundos que está sendo observada, ela vaga internamente para um local em que não há julgamento, nem necessidade de aprovação, apenas júbilo por estar viva.
É linda a forma como este “local” é representado na trama como uma zona específica em que se visualiza a união pelas potencialidades artísticas/criativas do mundano e do transcendental, a celebração da inspiração, e, próximo à esta área, vagam seres resmungões embrutecidos e agressivos, todo indivíduo que, em algum momento, perdeu a capacidade de se fascinar com os pequenos detalhes da experiência.
O leitmotiv da trama, a improvisação, que é a essência do Jazz, também é a essência da vida, a arte do inesperado, adaptar-se a cada passo da estrada. É fundamental que nunca se perca o encantamento dos olhos da criança, entender que o propósito, a paixão pessoal ou profissional que cada pessoa abraça no caminho, não o define enquanto indivíduo, o desejar é sempre mais divertido que o alcançar, porque, na realidade, a meta é apenas o hobby que te suaviza os obstáculos naturais na jornada do autoconhecimento rumo à finitude, o verdadeiro show é tudo aquilo que circunda o objetivo.
Há surpresas que não vou estragar, por isso evitei me aprofundar na trama, mas este é daqueles raros roteiros que te emocionam mais pós-sessão, quando você começa a refletir sobre tudo o que assistiu, uma pérola que vai tocar o coração de crianças e adultos, um dos melhores filmes do ano.
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