Minha Mãe é Uma Peça (2013)
Dona Hermínia (Paulo Gustavo) é uma mulher de meia idade, divorciada do marido (Herson Capri), que a trocou por uma mais jovem (Ingrid Guimarães). Hiperativa, ela não larga o pé de seus filhos Marcelina (Mariana Xavier) e Juliano (Rodrigo Pandolfo), que já estão bem grandinhos. Um dia, após descobrir que eles a consideram uma chata, resolve sair de casa sem avisar ninguém, deixando todos, de alguma forma, preocupados com o que teria acontecido. Mal sabem eles que a mãe foi visitar a querida tia Zélia (Suely Franco) para desabafar suas tristezas do presente e recordar os bons tempos do passado.
A contribuição de Paulo Gustavo para a comédia brasileira no cinema é valiosa, apesar de, infelizmente, ter sido interrompida precocemente. Triste pensar que ele ainda tinha muito a oferecer como artista. O seu humor intensamente popular encanta pela honestidade na entrega, principalmente na trilogia “Minha Mãe é Uma Peça”, adaptação do monólogo teatral homônimo, em que homenageia sua mãe, Déa Lúcia.
Na época de sua estreia, como já é de se esperar, meus colegas críticos apedrejaram a obra, talvez porque sua trama não se curva ao terrível politicamente correto (muito pelo contrário, debocha sobremaneira do cabresto) e reforça o valor da família, pauta abominada pelos ditos “progressistas”, ou porque simplesmente detestam qualquer filme brasileiro que seja abraçado calorosamente pelo público, afinal, sucesso é um crime neste país para quem depende da narrativa vitimista.
Eu escrevi naquele momento uma análise breve, ressaltando alguns problemas na estética e na execução, principalmente no terceiro ato, mas elogiei o carisma do protagonista e o coração pulsante da história. Revendo hoje, para este texto, entristecido pela interrupção precoce de sua carreira, enxerguei ainda mais beleza na mensagem que o filme transmite.
Paulo é um comediante que remete à tradição do cinema brasileiro, um personagem, um tipo caricato em tintas fortes, como Zé Trindade, Ankito, Oscarito, que, mesmo quando o produto tecnicamente não alcança seu pleno potencial, consegue manter o espectador atento do início ao fim com sua presença.
Ao dar vida à Dona Hermínia, ele consegue equilibrar bem o exagero (representado até pelo figurino colorido) e a ternura necessária para estabelecer uma conexão com o público, fazendo com que a suspensão de descrença funcione, já que, ao contrário da norte-americana Divine, a sua graça não nasce do fato de ser um homem travestido de mulher, alguns minutos bastam para que você compre a ideia e se permita entrar de cabeça na jornada agitada daquela mãe.
Ela é a típica mãe dos anos 80, fruto da geração Woodstock, desbocada, superprotetora, intensa, impulsiva, logo, uma pedra no sapato dos filhos adolescentes. O toque inteligente da obra é não se debruçar apenas nas possibilidades de gags, ela dedica tempo generoso na exploração das motivações da personagem, estreitando a identificação emocional com o espectador, revelando com sutileza (ponto positivo), nas cartas que a filha descobre, o passado romântico com o ex-marido, as raízes de suas frustrações, tornando seu comportamento mais crível. A reviravolta desmancha a caricatura (por vezes, conscientemente irritante), humaniza, ressignifica suas atitudes anteriores, engrandecendo o todo.
Ao final da sessão, com os créditos apresentando a homenageada, a reflexão que propõe se mostra mais importante que as piadas, a proposta intimista se exibe claramente e emociona.
Força para a família e os amigos neste momento tão difícil. Que sua arte siga inspirando as próximas gerações. Que nunca nos esqueçamos…