No “Dica do DTC”, a nova seção do “Devo Tudo ao Cinema”, a intenção não é entregar uma longa análise crítica, algo que toma bastante tempo, mas sim, uma espécie de drops cultural, estimulando o seu garimpo (lembrando que só serão abordados filmes que você encontra com facilidade em DVD, streaming ou na internet). O formato permite que mais material seja produzido, já que os textos são curtos e despretensiosos.
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Marcado (Branded – 2012)
Atormentado por visões, um ex-publicitário (Ed Stoppard) desvela uma campanha clandestina desenvolvida para despertar uma nova era de consumo desenfreado por todo o mundo.
“A publicidade foi inventada pelo Lenin. Você não se lembra disso? E agora, ela é a base da economia. A grande revolução global das marcas venceu. Estamos todos vivendo no mundo que Lenin criou…”
Esta pérola foi muito apedrejada em sua estreia, não há nada de grande relevância no currículo posterior dos seus diretores, sim, o sistema é implacável com todos aqueles que ousam despertar a massa.
O conceito trabalhado no roteiro é brilhante, a essência da mensagem, por trás do glacê aparentemente bobinho de ficção científica, presente principalmente no terceiro ato, avisava abertamente sobre alguns dos planos dos titereiros do caos para o futuro próximo no mundo, a manipulação grosseira em todos os setores.
Assista ao filme e depois reflita lucidamente sobre o que estamos testemunhando na imprensa hoje. Na área da política, aquele que dominava as manchetes como o maior criminoso de todos os tempos até meses atrás, com provas cabais, da noite para o dia, não é apenas inocente, como é aplaudido pelos mesmos jornalistas que defendiam outrora sua prisão.
Na área da saúde, praticar exercícios, algo que sempre foi estimulado pelos especialistas, da noite para o dia, passou a ser condenado, matérias agora alertam que a preocupação com o corpo pode causar problemas no coração (justificativa para um fenômeno recente?), e, estabelecendo conexão direta com um dos temas do filme, como defendido pelo guru do marketing, vivido por Max von Sydow, a obesidade, condição física que obviamente é perigosa, passou a ser vendida como positiva, até bela, leia-se, a doença foi romantizada e a verdade foi criminalizada.
Se o seu raciocínio lógico não foi aniquilado nos últimos 3 anos, você constata rapidamente que os objetivos só podem ser puramente grotescos.
“Nós completamos o primeiro passo da estratégia de negócios mais difícil e audaciosa da História. Nós começamos a alterar o conceito de beleza dos consumidores no Quênia, no Brasil, na Rússia. Eu garanto a vocês que, em cinco anos, ninguém vai reconhecer estes países…”
A propaganda é a alma do negócio. E, vale ressaltar, o negócio é sujo. Ela pode te fazer crer em qualquer absurdo, ela pode te levar a temer mortalmente algo que sempre existiu em sua rotina, normalizar todo tipo de humilhação, somente para te forçar um antídoto, que, na realidade, nada mais é que puro veneno. Os financiadores brindam sorridentes o sucesso do plano, conscientes de que estão apenas livrando o mundo do que consideram ser um excesso de bagagem. No pôster do filme, a frase: “Decifre o código, reassuma o controle de sua mente.”
É tão fácil, não há resistência, o processo de bestialização cultural, aliado ao supremo desinteresse de uma maioria preguiçosa, conseguiu em duas décadas preparar terreno fértil, os adultos hoje pensam e se expressam como crianças, logo, precisam de uma babá rígida.
“Marcado”, dirigido por publicitários, compreendeu bem os rumos tortos e desumanos da sociedade, afinal, não tinha como dar certo, este nunca foi o propósito.
“Antes, as marcas eram formadas pelas pessoas e seus desejos. Agora, as pessoas é que são formadas de acordo com o desejo das marcas…”
- Você encontra o filme com facilidade garimpando na internet.